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O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e a historiografia oitocentista da imprensa

The Brazilian Historical and Geographical Institute and the nineteenth century historiography of the press

Resumo

Este artigo remete aos primórdios dos estudos de jornalismo no Brasil, na medida em que propõe sistematização e exame crítico-reflexivo dos trabalhos pioneiros sobre o tema da imprensa periódica e seus jornalistas, produzidos no âmbito do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e seus congêneres. Considera-se o conjunto de relatos publicados entre meados dos séculos XIX e XX, a contar por aquele que seria o primeiro registro dedicado ao assunto, saído na revista da instituição em 1846. O objetivo é analisar tanto as tendências de investigação quanto de conceituação do fenômeno em pauta, pela geração que antecede os historiadores universitários. A conclusão a que se chega é de que, apesar do caráter descritivo e da abordagem de inventariação, tal produção converge na construção de uma narrativa particular em relação ao desenvolvimento da imprensa brasileira e seu papel junto à nação, como elemento civilizador e meio de instrução pública.

Palavras-chave:
História da Historiografia; Imprensa; Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB)

Abstract

This article refers to the beginnings of journalism studies in Brazil, insofar as it proposes systematization and critical-reflective examination of pioneering works on the subject of the periodical press and its journalists, produced within the scope of the Brazilian Historical and Geographical Institute (IHGB) and its counterparts. It is considered the set of accounts published between the mid-19th and 20th centuries, from what would be the first essay dedicated to the subject, published in the institution’s journal in 1846. The objective is to analyze both the trends of investigation and conceptualization of the phenomenon in question, by the generation that precedes university historians. The conclusion reached is that, despite the descriptive character and the inventorying approach, such production converges in the construction of a particular narrative in relation to the development of the Brazilian press and its role in the nation, as a civilizing element and means of public instruction.

Keywords:
History of Historiography; Press; Brazilian Historical and Geographical Institute (IHGB)

Introdução

Ao considerarmos consensual a tese de que, no Brasil, a produção do conhecimento histórico de forma disciplinada se vincula à fundação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), em 1838, podemos argumentar que as primeiras iniciativas de estudo da imprensa periódica também encontraram neste milieu e seus congêneres provinciais suas origens.1 1 Embora durante os setecentos surjam academias letradas com vocação historiográfica (ver KANTOR, 2004), há que se considerar que o estabelecimento da imprensa em terras brasileiras é posterior a esse período, estando relacionado à vinda da família real portuguesa, em 1808. Gestado durante a fase de consolidação do Estado nacional, sob o patrocínio do imperador dom Pedro II, o instituto levou a cabo um projeto de preservação da memória cultural e de afirmação da identidade nacional, apoiando-se na obra maior de figuras como Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878),2 2 Referenciado como o principal historiador brasileiro do século XIX, Varnhagen é descrito por estudiosos a exemplo de Temístocles Cezar como, “simultaneamente, um tipo-ideal e um outsider. Tipo-ideal porque parece representar, com perfeição, as premissas que envolvem o que Rodrigo Turin, com precisão, designou elementos constituintes do ethos do historiador oitocentista: a sinceridade, a cientificidade e a utilidade. Outsider porque a sinceridade nem sempre é transparente, a cientificidade nem sempre é metodologicamente verificável e a utilidade nem sempre é evidente. Varnhagen foi, portanto, ao mesmo tempo, um modelo comum e um trânsfuga dissimulado” (CEZAR, 2018, p. 20). ao mesmo tempo que esteve informado por uma “concepção herdada do iluminismo, de tratar a história enquanto um processo linear e marcado pela noção de progresso”, como sublinha Manoel Salgado Guimarães (1988GUIMARÃES, Manoel Luiz Lima Salgado. Nação e Civilização nos Trópicos: o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro e o projeto de uma história nacional. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 5-27, 1988. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.fgv.br/reh/article/view/1935 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 11).

Também chamando atenção para o papel da instituição no processo de formação nacional, Valdei Lopes de Araujo (2008ARAUJO, Valdei Lopes de. A experiência do tempo: conceitos e narrativas na formação nacional brasileira (1813-1845). São Paulo: Aderaldo & Rothschild, 2008. ) afirma que:

uma das principais tarefas a que se propunham os letrados no IHGB, nos seus primeiros anos, era estabelecer a nacionalidade dos fatos, o que significava submeter e reinterpretar os fatos coloniais a um novo tipo de crítica, só possível em um país independente, sob a liberdade de opinião aberta pela monarquia constitucional; e, ao mesmo tempo, reivindicar materialmente o passado brasileiro, que ainda aparecia como pertencente a Portugal (ARAUJO, 2008ARAUJO, Valdei Lopes de. A experiência do tempo: conceitos e narrativas na formação nacional brasileira (1813-1845). São Paulo: Aderaldo & Rothschild, 2008. , p. 157).

O que nos importa notar, contudo, é que, apesar da adoção da atividade de imprensa por parte expressiva da intelectualidade oitocentista - inclusive pelo próprio Varnhagen3 3 Ao retornar a Portugal, Varnhagen teve passagem pela imprensa literária, da qual se pode mencionar títulos como O Panorama (1837-1868) e a Revista Universal Lisbonense (1841-1853). Para um exame acerca dessa matéria, consultar a tese de doutorado de Evandro dos Santos (2014). -, não eram temas como o jornalismo com os quais se preocupavam prioritariamente este e outros sócios ilustres do IHGB.4 4 Mais especificamente, conforme Guimarães (2011, p. 143), ao realizar uma avaliação da Revista IHGB, “obras e fontes a respeito da questão indígena, da história regional, bem como relatórios de pesquisas e de viagens, [...] ocupam cerca de 73% da totalidade das publicações na revista”. Isto não quer dizer que trabalhos sobre imprensa não tenham eventualmente aparecido, mas que esta, como objeto de conhecimento, manteve-se praticamente inexplorada no período aqui em exame, do Império à Primeira República. Com base na pesquisa de artigos e inventários publicados ao longo dessa trajetória, vamos sustentar que, ainda assim, seus autores lograram cultivar uma ideia singular sobre o fenômeno, de acordo com a qual os jornais são espelhos fiéis da nação e, por isso mesmo, testemunhos autênticos da história de seu tempo.

Ao entendermos que, como ensina Francisco FalconFALCON, Francisco. Sobre história, historiografia e historiadores: entrevista com Francisco Falcon. Entrevistadoras: Marcia de Almeida Gonçalves e Rebeca Gontijo Teixeira. História da Historiografia: International Journal of Theory and History of Historiography, Ouro Preto, v. 4, n. 7, p. 365-382, nov./dez. 2011. Disponível em: Disponível em: https://www.historiadahistoriografia.com.br/revista/article/view/319/224 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, “a história da historiografia é o reconhecimento do caráter histórico do próprio historiar, da própria escrita da história”, e que “talvez uma história da historiografia tenha que ser delimitada em termos do objeto” (2011, p. 371), nosso objetivo aqui é escrutinar as origens do conhecimento histórico especificamente sobre a imprensa periódica, produzido no âmbito do IHGB. Para tanto, trabalhamos com um elenco de aproximadamente 20 nomes que apresentam contribuição para o tema, levando em conta duas possibilidades de análise: textos saídos na Revista IHGB, bem como em publicações do gênero mantidas pelos institutos históricos; ou em outras plataformas, desde que seus autores tenham vínculo com o IHGB e/ou seus congêneres.

Salvo melhor juízo, a história dos nossos jornais começa a ser narrada a partir de inventário menor publicado no tomo oitavo da Revista IHGB, cuja primeira publicação data de 1839. De autoria do político e magistrado piauiense Francisco de Sousa Martins (1805-1857), Progresso do jornalismo no Brasil (1846) informa, em suas 14 páginas, o título e algum outro detalhe sobre os primeiros periódicos impressos em terras brasileiras.

Ainda que amparado em números incompletos e projeções irreais sobre a circulação das folhas, o relato antecipa tendências que marcariam os primórdios da historiografia brasileira da imprensa: apontamento da repressão do governo português como obstáculo maior para a implantação da tipografia no Brasil colonial; crítica com fins de estereotipagem da Gazeta do Rio de Janeiro (1808-1922) e da Idade d’Ouro do Brazil (1811-1823) como “órgãos oficiais insignificantes” - sem implicar, de imediato, em reconhecimento do Correio Braziliense (1808-1922); e supervalorização do periodismo que se desenvolve a partir do período regencial, colocando-o em nível de igualdade com os casos inglês e francês.

No que se segue vamos explorar cada tópico. A começar pela discussão sobre as tentativas de introdução do prelo nos tempos da colônia, que será reconstituída especialmente com base nas proposições do grupo de historiadores ligados ao Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano (IAGP). O cerne da questão é como se tentou, mediante a substituição de uma hipótese por outra, preservar a narrativa de Pernambuco como berço da nossa imprensa. Entre os propositores, Alfredo de Carvalho (1870-1916) que, século mais tarde, veio a ser tomado como figura paradigmática para a fundação da Associação Brasileira de Pesquisadores de História da Mídia (Alcar). A partir da leitura sistemática da produção sobre o tema, busca-se mostrar, sem negar o mérito do investigador, que, ao invés de ruptura, existe um conjunto de continuidades entre ele e seus antecessores ou contemporâneos.

Paralelamente, verificam-se, entre os membros do IHGB, esforços na direção de resgate da trajetória de Hipólito da Costa (1774-1823), que passa a ser legitimado como o fundador do jornalismo brasileiro. Por outro lado, a maioria deles compartilha de visão bastante negativa sobre a imprensa de combate, surgida em meio ao processo de independência. A fase panfletária começaria a ser superada, segundo eles, com a fundação do Jornal do Commercio (1827-2016), aclamado como uma espécie de “Times brasileiro” (FERNANDES PINHEIRO, 1859FERNANDES PINHEIRO, Joaquim Caetano. A imprensa no Brazil. Revista Popular, Rio de Janeiro, a. 1, t. 4, p. 217-224, 1859. Disponível em: Disponível em: https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=181773&pagfis=0 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 224). A comparação com o estrangeiro não se daria por acaso; argumenta-se que esta seria uma entre outras estratégias empregadas na elaboração de narrativas que visavam enaltecer o progresso do jornalismo no Segundo Reinado.

Evidencia-se, por fim, como esse modo de historicizar - tantas vezes limitado ao ordenamento cronológico dos periódicos - foi se esgotando à medida que os institutos históricos entraram em declínio. Cabe observar, ao mesmo tempo, o aparecimento de contribuições de outra natureza, de caráter ensaístico, provenientes da intelectualidade reunida na Academia Brasileira de Letras (ABL)ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS. Curso de Jornalismo: conferências realizadas na Academia Brasileira de Letras. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 1958., inaugurada em 1897. Com trânsito por ambos estabelecimentos, Barbosa Lima Sobrinho (1897-2000) foi responsável por uma das primeiras e mais notáveis obras histórico-reflexivas a tratar da modernização em curso na imprensa. E, dada a qualidade crítica, pode ser lida como sinal de transição para uma historiografia epistemologicamente menos inventariante e mais interpretativa, que, pelo menos no que diz respeito ao jornalismo, se desenvolveria na segunda metade do século XX em diante.

A discussão sobre a entrada da tipografia no Brasil Colônia

A imprensa no Brazil (1859), ensaio de oito páginas escrito pelo cônego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro (1825-1876) e apresentado no tomo quarto da Revista Popular (1859-1862) - uma das mais conceituadas publicações daquele momento5 5 Conforme Giselle Martins Venancio (2013, p. 1161), editada pela Livraria e Casa Editorial Garnier, a referida revista destacou-se “no Brasil de meados do século XIX como espaço dinâmico de debate e divulgação de conhecimentos”, colaborando para que a ciência fosse considerada um “aspecto significativo” por um “público ampliado - para além dos círculos estritamente intelectuais”. -, constitui-se em esforço precursor de interpretação da história da imprensa brasileira e, ao mesmo tempo, elemento construtor do mito sobre a introdução da atividade no Brasil holandês. A partir da indagação sobre como e onde foram produzidos os primeiros impressos em território brasileiro, o historiador e publicista carioca procura subsídios para sustentar a hipótese de que suas origens remontam ao projeto de ocupação do nordeste pelos holandeses no século XVII.

Tendo-se doutorado em teologia na Itália, ao retornar para sua cidade de nascimento, atuou como secretário do IHGB e catedrático de retórica e poética do Colégio Pedro II, deixando obra sobre matéria literária. No que concerne à história da imprensa periódica, a contribuição foi menor e isolada, semelhante a da maioria dos historiadores oitocentistas recuperados nas páginas a seguir. Mas, ainda que sucinta, possui diferencial em relação a estas outras, pois ensaia interpretação sobre os primórdios da produção da palavra impressa na colônia, em vez de se deter no registro e na ordenação dos títulos e datas dos jornais provinciais, como visto frequentemente nos inventários de seus colegas de instituto.

Argumenta Fernandes Pinheiro que “foi Portugal uma das nações da Europa, que primeiro acolheu a arte tipográfica” (1859, p. 218), ocorrendo isto no século XV, e tendo a situação, no entanto, se alterado drasticamente em seguida. Sob o obscurantismo que se instaurou, o Brasil fora considerado pelo colonizador português “a última âncora de salvação”, o que explicaria a tentativa em “soldar-nos ao seu jogo por todas as cadeias do egoísmo e do monopólio” (FERNANDES PINHEIRO, 1859FERNANDES PINHEIRO, Joaquim Caetano. A imprensa no Brazil. Revista Popular, Rio de Janeiro, a. 1, t. 4, p. 217-224, 1859. Disponível em: Disponível em: https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=181773&pagfis=0 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 219). Plano este frustrado pela ocupação holandesa em Pernambuco, responsável por “acender entre nós um foco de luz”, haja vista “a sagacidade e tino administrativo com que governou a colônia brasílico-neerlandesa o conde Maurício Nassau” (FERNANDES PINHEIRO, 1859FERNANDES PINHEIRO, Joaquim Caetano. A imprensa no Brazil. Revista Popular, Rio de Janeiro, a. 1, t. 4, p. 217-224, 1859. Disponível em: Disponível em: https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=181773&pagfis=0 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 219).

Entre os “grandes melhoramentos” trazidos pela administração do conde, estariam o “sincero amor às letras, e esclarecida proteção, que dava aos seus cultores” (FERNANDES PINHEIRO, 1859FERNANDES PINHEIRO, Joaquim Caetano. A imprensa no Brazil. Revista Popular, Rio de Janeiro, a. 1, t. 4, p. 217-224, 1859. Disponível em: Disponível em: https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=181773&pagfis=0 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 220). Por causa disso, mas também pela “doçura e elevação de vistas que lhe atribuem os seus próprios adversários, devemos supor que não excluísse a tipografia dos elementos civilizadores, que com tanto zelo importava em nossa terra” (FERNANDES PINHEIRO, 1859FERNANDES PINHEIRO, Joaquim Caetano. A imprensa no Brazil. Revista Popular, Rio de Janeiro, a. 1, t. 4, p. 217-224, 1859. Disponível em: Disponível em: https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=181773&pagfis=0 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 220). Com a expulsão dos holandeses, porém, “desapareceu a imprensa dentre nós, que não convinha ela aos planos, que já apontamos da metrópole, e aos quais volveu com notável ingratidão” (FERNANDES PINHEIRO, 1859FERNANDES PINHEIRO, Joaquim Caetano. A imprensa no Brazil. Revista Popular, Rio de Janeiro, a. 1, t. 4, p. 217-224, 1859. Disponível em: Disponível em: https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=181773&pagfis=0 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 221).

Mas e como comprovar que foram os holandeses os tipógrafos aqui estreantes? Em resposta à questão que ele mesmo coloca, menciona a existência de folheto, escrito em holandês e gravado em caracteres góticos, intitulado Brasilsche Gelt-Sack (A bolsa de dinheiro brasileiro, em português). Com base na consulta deste único documento que se declarava impresso em Recife, no ano de 1647, afirma o articulista o seguinte:

é, pois, evidente, que os holandeses introduziram a imprensa nas nossas províncias do norte, sentindo não podermos marcar com exatidão a época, em que tão grande sucesso teve lugar: crendo, todavia, podê-lo colocar entre os anos de 1637 a 1638, isto é, durante o primeiro período do governo de Nassau, consagrado à obra de reparação dos males inerentes à conquista, e antes que houvesse empreendido a malfadada expedição da Bahia (FERNANDES PINHEIRO, 1859FERNANDES PINHEIRO, Joaquim Caetano. A imprensa no Brazil. Revista Popular, Rio de Janeiro, a. 1, t. 4, p. 217-224, 1859. Disponível em: Disponível em: https://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=181773&pagfis=0 . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 221).

A elucidação da questão mobilizaria grupo ligado ao Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano, cuja fundação remete a 1862. Um de seus comissionados, José Higino Duarte Pereira (1847-1901) traduziu o referido folheto holandês e o publicou na Revista IAGP acompanhado de apresentação sob o título de Advertência (1883). Conforme seu parecer, este teria começado a ser escrito em Pernambuco, mas finalizado na Holanda, sendo ali impresso. Até porque, “se tivesse introduzido a imprensa na capital do Brasil holandês durante os oito anos do governo de Nassau, é extraordinário que o seu panegirista Barleus não comemorasse um fato tão honroso para este príncipe amigo das artes e das letras” (DUARTE PEREIRA, 1883DUARTE PEREIRA, José Higino. Advertência. Revista do Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano, Recife, n. 28, p. 121-126, 1883. , p. 124).

Em Estabelecimento e desenvolvimento da imprensa em Pernambuco (1891), artigo também encaminhado à revista do instituto, Francisco Augusto Pereira da Costa (1851-1923) sistematiza as observações feitas pelo colega e, sem dúvida, reitera que o opúsculo “não foi impresso em Pernambuco” (PEREIRA DA COSTA, 1891PEREIRA DA COSTA, Francisco Augusto. Estabelecimento e desenvolvimento da imprensa em Pernambuco. Revista do Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano, Recife, n. 39, p. 25-54, 1891. , p. 25). No entanto, ao desfazer “pela luz da crítica a suposição da existência da imprensa em Pernambuco no tempo do domínio holandês, em meados do século XVII” (PEREIRA DA COSTA, 1891, p. 26), acaba ele por sobrepô-la à outra, de maneira a assegurar o reconhecimento do pioneirismo da capitania do nordeste em relação à arte tipográfica no país:

efetivamente, em 1706, ou pouco antes, como refere Antonio Joaquim de Mello em suas Biografias, estabeleceu-se uma tipografia em Recife, que começou por imprimir letras de câmbio e breves orações devotas, mais tendo a Ordem Régia de 8 de julho do mesmo ano ordenado ao governador de Pernambuco que mandasse sequestrar as letras impressas, e notificar os donos delas e oficiais da tipografia - “que não imprimissem, nem consentissem que se imprimissem livros, nem papéis alguns avulsos” - a tipografia desapareceu (PEREIRA DA COSTA, 1891PEREIRA DA COSTA, Francisco Augusto. Estabelecimento e desenvolvimento da imprensa em Pernambuco. Revista do Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano, Recife, n. 39, p. 25-54, 1891. , p. 26).

Tal afirmativa de que teria operado prelo em Recife no princípio do século XVIII veio a ser endossada por Alfredo de Carvalho (1870-1916), em Annales da imprensa periódica pernambucana de 1821-1908 (1908aCARVALHO, Alfredo de. Annales da imprensa periódica pernambucana de 1821-1908. Recife: Typographia do Jornal do Recife, 1908a.) e Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil (1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b.). Como os títulos sugerem, o conjunto da obra não se restringe ao debate sobre a questão da implantação da tipografia em Pernambuco no período colonial, na medida em que inventaria jornais e revistas que circularam tanto na província quanto em outras partes do império, no transcorrer do século XIX. Trata-se, na realidade, de empreendimento iniciado pelo investigador no IAGP, e que evoluiu para projeto coletivo, como extensão da exposição comemorativa do centenário da imprensa brasileira, organizada pelo IHGB, e que, por conseguinte, reuniu pesquisadores de outras agremiações estaduais.

A extensa catalogação dos periódicos é precedida de monografia sobre a introdução da imprensa, na qual Carvalho enfatiza que em países como México e Peru a tipografia desembarcou no século XVI e, no seguinte, este também foi o caso dos Estados Unidos. Enquanto isso, “o Brasil era, talvez, o único dos países americanos que ainda não a possuía”. Mantém-se a dúvida, pois, ao considerar que pela atuação da Companhia de Jesus se efetuou a introdução da “arte tipográfica na Índia, na China e no Japão, dando à luz preciosos vocabulários e gramáticas das línguas indígenas [...], não é inverosímil que pela mesma época [...] existissem também no Brasil tipografia fundadas pelos jesuítas” (CARVALHO, 1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b., p. 3-4).

Fora aqui, a seu ver, instaurado regime de atraso pela coroa portuguesa, cuja “legislação, severa até a crueldade, regulava em suas mais insignificantes funções toda a vida econômica e industrial, e a introdução de quaisquer melhoramentos nela imprevistos vinham prontamente embargar novas disposições condenatórias”. Entrementes, porém, com a ocupação dos holandeses no nordeste, surgiram “importantes melhoramentos materiais e transformaram em pouco tempo o Recife, de insignificante povoado de pescadores, na primeira cidade brasileira”. Abriu-se ensejo à introdução da imprensa por volta de 1645, mas estes interesses foram absorvidos, “já que Maurício de Nassau havia deixado o Brasil, e a administração da colônia, entregue à incompetência de ávidos traficantes” (CARVALHO, 1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b., p. 6-17).

Esta pátria conservou-se, ainda assim, como a mais pródiga do país para a arte tipográfica. Tanto é que “em 1706, ou pouco antes, um indivíduo empreendedor, de nome infelizmente ignorado, logrou estabelecer no Recife uma pequena tipografia, em que se limitava a impressão de letras de câmbio e breves orações devotas”. Mas posto que “o receio de que o valioso instrumento de liberdade pudesse ser aqui implantado clandestinamente jamais abandonou o ânimo precavido dos ministros portugueses”, seu funcionamento não foi tolerado, e “da sua existência efêmera é testemunho único o documento ordenando a sua supressão, não tendo chegado até nós um só dos seus modestos produtos” (CARVALHO, 1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b., p. 18-19).

O que veio, “enfim, atenuar os rigores deste sistema odiento e instituir definitivamente a imprensa nesta parte da América” foi a transferência da corte para o Rio de Janeiro, em 1808 (CARVALHO, 1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b., p. 23). Apesar da imediata instalação e funcionamento da Impressão Régia na cidade, antigas restrições se mantiveram. “Durante o Primeiro Reinado e sobretudo na capital do império, a liberdade de imprensa foi ilusória, devido à intervenção constante do poder” (CARVALHO, 1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b., p. 29). Nem assim, é verdade, se impediu que a nossa imprensa fizesse “notáveis progressos” (CARVALHO, 1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b., p. 29). No caso de Pernambuco, onde o primeiro jornal foi a Aurora Pernambucana (1821) e o mais antigo é o Diário de Pernambuco (1825-), o jornalismo “esteve quase que limitado ao da capital” até o final do século XIX, época também “assinalada por extraordinária expansão do jornalismo recifense” (CARVALHO, 1908aCARVALHO, Alfredo de. Annales da imprensa periódica pernambucana de 1821-1908. Recife: Typographia do Jornal do Recife, 1908a., p. 52-54).

Prova disso se demonstra ao longo da etapa de catalogação, que reúne 1.619 títulos publicados na província até 1908. Para tanto, o investigador explorou coleções adquiridas e disponibilizadas por ilustres, buscando tomar nota dos seguintes itens de cada periódico:

o título, o subtítulo, a localidade, a tipografia, o impressor, o ano, o formato, a data do primeiro e do último número, a descrição do emblema, ou da vinheta, a epígrafe, ou divisa, a periodicidade da publicação, o preço da assinatura e do número avulso, a tiragem, os nomes dos redatores, colaboradores, proprietários e gerentes, o programa, a orientação, as tendências, enfim todas as informações desejáveis e... possíveis (CARVALHO, 1908aCARVALHO, Alfredo de. Annales da imprensa periódica pernambucana de 1821-1908. Recife: Typographia do Jornal do Recife, 1908a., p. IX).

A realização integral da tarefa de descrição pormenorizada, admite, ficou impossibilitada por causa da própria natureza destes enquanto documentos históricos. Por exemplo, “quanto à tiragem exata de cada jornal, só muito raramente conseguimos fixar cifras fidedignas, pois, é sabido o empenho existente em ocultá-las, ou exagerá-las, não merecendo inteiro crédito nem mesmo as francamente declaradas”. Ou então, “de averiguação menos difícil, mas, nem sempre possível, achamos os nomes dos redatores, devido à prática dominante do anonimato” (CARVALHO, 1908aCARVALHO, Alfredo de. Annales da imprensa periódica pernambucana de 1821-1908. Recife: Typographia do Jornal do Recife, 1908a., p. X). Em que pese obstáculos do tipo, na condição de fontes históricas, “não é lícito negar-se-lhes enorme importância como repositórios de fatos sociológicos, porquanto reproduzem com fidelidade inexcedível as grandes correntes e as pequenas vagas da vida nacional” (CARVALHO, 1908aCARVALHO, Alfredo de. Annales da imprensa periódica pernambucana de 1821-1908. Recife: Typographia do Jornal do Recife, 1908a., p. VII).

Em relação ao seu estudo sobre as origens da tipografia no Brasil, faltaria espaço aqui para desenvolver avaliação pormenorizada das evidências apresentadas, embora convenha registrar o seguinte quadro: a proposição de que houve operação tipográfica no Recife setecentista permanece no campo da hipótese, tendo sido questionada por falta de confiabilidade da prova documental (MARTINS, 1957MARTINS, Wilson. A palavra escrita. São Paulo: Anhembi, 1957., p. 339-340); e sobre o caso em que existe evidência contundente, este é creditado ao tipógrafo português Antônio Isidoro da Fonseca, responsável por oficina de impressão que funcionou no Rio de Janeiro, durante breve período de tempo em 1747 (HALLEWELL, 2012HALLEWELL, Laurence. O livro no Brasil. 3. ed. São Paulo: EDUSP, 2012., p. 85-96).

O essencial no presente artigo é, todavia, a compreensão do significado produzido por este grupo de historiadores oitocentistas. Em ambas as hipóteses levantadas, o que emerge é uma narrativa que situa Pernambuco como berço da arte tipográfica no país e, portanto, espaço central na constituição da nossa imprensa. Posto nas palavras de Carvalho (1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b., p. 55): “de Pernambuco, foco de onde irradiou a cultura por todo o Brasil oriental, derramou-se também a imprensa pelas províncias vizinhas”. Encaminhando-se para o final do século, a marca da narrativa não é outra senão esta mesma: “quer pelo lado moral, quer pelo material, a imprensa pernambucana ocupa hoje um lugar de honra na comunhão geral da imprensa do país”, como escreve Pereira da Costa (1891PEREIRA DA COSTA, Francisco Augusto. Estabelecimento e desenvolvimento da imprensa em Pernambuco. Revista do Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano, Recife, n. 39, p. 25-54, 1891. , p. 41).

Em resumo, trata-se de abordagem que é ao mesmo tempo nativista, pois se ancora no “orgulho”, e liberal, na medida em que traz Portugal absolutista e escravista como viés. Estudiosa da produção do instituto, Lilia Schwarcz afirma, nessa linha, que, “fruto de uma elite rural tradicional, porém decadente”, “o IAGP respondia, no fundo, às aspirações políticas e culturais da província pernambucana, que pretendia manter sua hegemonia ao menos no interior da região nordestina”. Assim, “a postura do IAGP foi sempre a mesma: enaltecer o papel especial da província”, “mesmo porque os diferentes temas da história nacional só pareciam ter sentido quando interligados a um enfoque local” (Schwarcz, 1993SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças. São Paulo: Companhia das Letras , 1993., p. 118-121).

Ao recuperar a discussão sobre o aparecimento da tipografia na colônia, José Marques de Melo (1943-2018) salientou tendências historiográficas de outra ordem. Para o acadêmico alagoano, o que mais chama atenção é o modo como o coletivo liderado por Alfredo de Carvalho encontrou em fatores políticos - censura do governo português, notadamente - explicação para o atraso na introdução da atividade no país. Seu ponto de vista alternativo sobre o assunto é apresentado em Sociologia da imprensa brasileira (1973), tese na qual formula a hipótese de que a imprensa foi por aqui implantada com retardamento de três séculos, porque não se fez necessária à vida colonial brasileira, cuja marca seria o “atraso” cultural.

Convém, no entanto, perceber mudança de juízo do estudioso com relação aos intelectuais do IAGP. Se, na tese doutoral, julgou limitada a análise de Carvalho e seus colegas - por se aterem às “causas aparentes” que retardaram a produção da palavra impressa -, posteriormente essa crítica foi atenuada, ao passo que o pernambucano foi tomado como “paradigma” da Associação Brasileira de Pesquisadores de História da Mídia. Fundada como Rede Alfredo de Carvalho, em 2001, sob a liderança do acadêmico uspiano, entre outros méritos, conferiu-lhe o pioneirismo no estudo sistemático da história da imprensa brasileira:

pertencente à geração dos jornalistas-historiadores que elucidaram a charada da mítica tipografia holandesa do século XVII, Alfredo de Carvalho foi o responsável pela pesquisa que desfez aquele equívoco histórico. Notabilizou-se pelo resgate da memória da imprensa brasileira do século XIX, empreitada que resultou na “alentada monografia sobre a trajetória histórica da imprensa brasileira, incentivando seus colaboradores a produzir perfis regionais”. [...] Em reconhecimento ao seu pioneirismo foi escolhido como patrono da Rede estruturada para o Resgate da Memória da Imprensa e a Construção da História da Mídia no Brasil - Rede Alcar (MARQUES DE MELO, 2012MARQUES DE MELO, José. História do jornalismo: itinerário crítico, mosaico contextual. São Paulo: Paulus, 2012. , p. 328-329).

Sem pôr em dúvida o engenho desse desbravador da história da nossa imprensa, cabe-nos, no papel de quem está propondo leitura sistemática da produção historiográfica sobre o tema, trazer à reflexão algumas ponderações, sob pena de reforçar a mitificação da sua figura enquanto inaugurador de uma tradição. Até porque, a nosso entender, a atitude elogiosa em nada ou pouco agrega ao amadurecimento da discussão historiográfica. Para tal, o primeiro aspecto a clarificar é o de que, como seguirá sendo exposto, Alfredo de Carvalho não foi o primeiro nem o último historiador a efetuar esforços na catalogação dos jornais e revistas que circularam no decorrer do século XIX, seja em âmbito regional ou nacional.

Outro ponto a esclarecer é que seu trabalho, em vez de se diferenciar ou até mesmo ensaiar ruptura, pelo contrário, converge com características identificadas nos demais. Em razão disso, rotular sua contribuição como única e distinta acaba por favorecer interpretação equivocada dentro do quadro da tradição. Como se demonstrará, entre antecessores e sucessores, os investigadores dos institutos históricos, que se preocuparam com a temática do jornalismo, em verdade, apresentaram relatos que se assemelham em vários aspectos, a começar pelo entendimento deste enquanto elemento para o progresso da nação.

O mérito de Hipólito da Costa como publicista do processo de Independência

Ainda que fosse conhecida sua atuação à frente do Correio Braziliense ou Armazém Literário, levado a público de 1 de junho de 1808 a 1 de dezembro de 1822, não fora Hipólito da Costa (1774-1823) aclamado, desde o princípio, como o fundador do nosso jornalismo. Historiadores oitocentistas como Sousa Martins e Fernandes Pinheiro, além do próprio Alfredo de Carvalho, tenderam a situar o marco inaugural do periodismo brasileiro na criação da Gazeta do Rio de Janeiro, cujo primeiro número saiu em 10 de setembro de 1808. Assim, o pioneirismo da atividade caberia, em alguma medida, ao seu primeiro redator, isto é: o frei português Tibúrcio José da Rocha (1776-1840), oficial da Secretaria dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, da qual a gazeta era propriedade.

A recuperação histórica direcionada a autoridades e órgãos pertencentes ao governo era, convém assinalar, tendência de uma historiografia que visava produzir uma versão oficial sobre o passado. Entretanto, não se pode desconsiderar que, pelo menos no caso dos historiadores da imprensa, o que predominava era um juízo de valor negativo a respeito da Gazeta do Rio de Janeiro, mesmo quando se ignorava a existência do Correio Braziliense. O consenso era de que a folha editada na capital imperial não passava de um “insignificante” jornal oficial mantido durante a permanência de dom João VI no Brasil, visto que se ocupava:

quase exclusivamente com as notícias da guerra que então se fazia na Europa, contra o poder de Napoleão Bonaparte, e com a publicação de alguns poucos atos oficiais, principalmente despachos de empregados públicos, e ocasionalmente alguns anúncios das novas composições literárias que saiam à luz (SOUSA MARTINS, 1846SOUSA MARTINS, Francisco de. Progresso do jornalismo no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. VIII, p. 262-275, 1846. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsNnF5QnpQTURqOXc/view?resourcekey=0-ZdYNtxLTscuimNcKRdyKYA . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 262).

Apreciação semelhante se aplicara a Idade d’Ouro do Brasil, considerado o primeiro representante do periodismo baiano. Tal como a gazeta carioca, “era uma espécie de órgão oficial, enchendo exclusivamente as suas colunas com os atos do governo, notícias de alguns acontecimentos mais notáveis da corte e do estrangeiro, anúncios e avisos particulares”; ainda que se pondere que, “nos últimos anos, porém, tomou parte ativa nas lutas políticas da época” (CARVALHO, 1908bCARVALHO, Alfredo de. Gênese e progressos da imprensa periódica no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. esp., p. 1-89, 1908b., p. 32), especialmente o movimento constitucionalista de 1821.

À medida que ajuizamentos do tipo se repetiram, outros passaram a atribuir importância a Hipólito da Costa e seu jornal - ou revista mensal, como foi constantemente encarada pelos historiadores eruditos. Ocupante do cargo de primeiro secretário do IHGB, Manuel Duarte Moreira de Azevedo (1832-1903) foi um deles, comentando que “apesar de proibido algum tempo no Rio de Janeiro”, há que se salientar que o Correio Braziliense “era lido sem reserva até no próprio paço do rei, e [...] foi mais tarde francamente admitido, sendo permitida a sua venda e leitura”. Por meio dessa publicação, seu fundador e editor manifestou “elevado talento e variada instrução, e advogou toda e qualquer ideia que parecia útil ao Brasil, concorrendo desse modo para o engrandecimento e prosperidade de sua pátria” (MOREIRA DE AZEVEDO, 1865MOREIRA DE AZEVEDO, Manuel Duarte. Origem e desenvolvimento da imprensa no Rio de Janeiro. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. XXVIII, p. 169-224, 1865. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsc015R3hMbWdVcjg/view?resourcekey=0-SQLoNNWyYwUoVxQmUZDc4Q . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 181).

A valorização deste personagem histórico ficaria mais visível a partir do relato biográfico de Francisco Inácio Marcondes Homem de Melo (1837-1918) - político filiado ao Partido Liberal e catedrático de história universal do Colégio Pedro II. Publicado na parte segunda do tomo 35º da Revista IHGB, que tradicionalmente reservava espaço para biografias de “brasileiros ilustres por letras, armas e virtudes”, o artigo introduz “Hyppolito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça” como “publicista eminente, que, na época agitada da independência, armado da cólera do patriotismo, intimou à metrópole os direitos da oprimida colônia do Brasil” (HOMEM DE MELO, 1872HOMEM DE MELO, Francisco Inácio Marcondes. Hyppolito José da Costa Pereira. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. XXXV, pt. II, p. 203-245, 1872. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsRkRhblVHWklMSm8/view?resourcekey=0-sUFhsd-ijV-xUfQb8jquuQ . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 203). O que pretendia com sua folha era “levantar o Brasil, a sua pátria, pela difusão das luzes e prepará-lo para melhores destinos” (HOMEM DE MELO, 1872HOMEM DE MELO, Francisco Inácio Marcondes. Hyppolito José da Costa Pereira. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. XXXV, pt. II, p. 203-245, 1872. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsRkRhblVHWklMSm8/view?resourcekey=0-sUFhsd-ijV-xUfQb8jquuQ . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 212). Para tanto, durante seu exílio na Inglaterra, produziu “monumento de inestimável valor”, uma vez que “está aí escrita a história autêntica de todos os acontecimentos memoráveis da monarquia portuguesa, no período de 1808 a 1822” (HOMEM DE MELO, 1872HOMEM DE MELO, Francisco Inácio Marcondes. Hyppolito José da Costa Pereira. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. XXXV, pt. II, p. 203-245, 1872. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsRkRhblVHWklMSm8/view?resourcekey=0-sUFhsd-ijV-xUfQb8jquuQ . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 232).

Os historiadores do IHGB que se seguiram passaram a ressaltar tais qualidades e ações em prol da nação. Entre eles, Max Fleiuss (1868-1943), secretário perpétuo do instituto, que ficou encarregado de realizar trabalho de revisão para o Dicionario histórico, geográfico e etnográfico do Brasil (1922). Nas palavras dele, o que almejava aquele “filho da efêmera Colônia do Sacramento”, ao editar o Correio Braziliense por quase 15 anos, era fazer “de si próprio o primeiro cidadão brasileiro”. Tanto é que seu jornal “só deixou de existir quando se transformou em realidade o ideal da causa por que sempre se batera - a Independência do Brasil” (FLEIUSS, 1922FLEIUSS, Max. História da imprensa no Brasil. In: INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO. Diccionario historico, geographico e ethnographico do Brasil: commemorativo do primeiro centenario da Independencia. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1922. p. 1550-1585. , p. 1552-1553).

Sócio efetivo do IHGB e correspondente do IAGP, Barbosa Lima Sobrinho concordara com esta afirmativa de que foram características definidoras da trajetória do Correio Braziliense ações tanto a favor do movimento de independência quanto contra o trabalho escravo e o tráfico de pessoas. Para o autor de O problema da imprensa (1923), enquanto a Gazeta do Rio de Janeiro exerceu pouca influência no debate público dessas e outras questões, a do jornal de Hipólito foi “notória”, pois “liam-no e apreciavam-no os homens mais cultos do país e a sua repercussão a tal ponto se acentuou, que foi perseguido pelo governo português” (BARBOSA LIMA SOBRINHO, 1923LIMA SOBRINHO, Barbosa. O problema da imprensa. Rio de Janeiro: Álvaro Pinto, 1923., p. 85).

Fundamental, senão determinante, para a definição de entendimento consensual acerca do nome fundador da imprensa brasileira foi o trabalho biográfico de Carlos Rizzini (1898-1972): Hipólito da Costa e o Correio Braziliense (1957RIZZINI, Carlos. Hipólito da Costa e o Correio Braziliense. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1957. ). Membro do IHGB e do Instituto Histórico de Petrópolis (IHP), já afirmava em O livro, o jornal e a tipografia no Brasil (1946) que, “até a regência de d. Pedro, foi o Correio Braziliense o nosso único jornal - informativo, doutrinário e pugnaz” (RIZZINI, 1988RIZZINI, Carlos. O livro, o jornal e a tipografia no Brasil, 1500-1822: com um breve estudo geral sobre a informação. 2. ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1988 [1946] . , p. 341). À vista disso, “o Correio Braziliense parece-se mais com um jornal moderno do que as folhas que se seguiram a partir de 1821”, tendo como preocupações “o comércio internacional e a colonização pelo braço livre” (RIZZINI, 1988RIZZINI, Carlos. O livro, o jornal e a tipografia no Brasil, 1500-1822: com um breve estudo geral sobre a informação. 2. ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1988 [1946] . , p. 347-350), por exemplo.

Na análise de Rizzini, no entanto, ficam inexplorados pontos sobre como o publicista, por exemplo, arcava com os custos de produção e distribuição de seu periódico que, “apesar de interditado, circulou intensamente”. Surge aqui um importante ponto de contradição, uma vez que o biógrafo se esforça em enfatizar a autonomia da publicação, declarando que “era a única isenta da influência do governo [português]” (RIZZINI, 1988RIZZINI, Carlos. O livro, o jornal e a tipografia no Brasil, 1500-1822: com um breve estudo geral sobre a informação. 2. ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1988 [1946] . , p. 361); por outro lado, revela que, no fim, “o que propriamente induziu Hipólito a suspender o Braziliense foi a oportunidade diplomática que lhe abriu D. Pedro”, visando “recompensá-lo com o consulado geral de Londres, mas quando assinou o decreto já ele falecera” (RIZZINI, 1988RIZZINI, Carlos. O livro, o jornal e a tipografia no Brasil, 1500-1822: com um breve estudo geral sobre a informação. 2. ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1988 [1946] . , p. 363).

Ou seja, expõe-se a vida e obra do biografado, mas sem favorecer o desvelamento do jogo de interesses que se inscreve nas relações sociais típicas da época, pois não se poderia correr qualquer risco de desmistificá-lo. A tendência deve ser de apagamento das incongruências entre a prática de um jornalismo tido como independente e a sua realidade de confecção, em prol da construção de uma narrativa que visa homenagear esse indivíduo herói. Isto para dizer que a contribuição de Rizzini, embora apresente considerável avanço enquanto trabalho historiográfico, não representa uma ruptura com a tradição narrativa, herdada dos eruditos do IHGB. Trata-se, vendo bem, de versão mais bem-acabada, pelo menos no que concerne aos estudos sobre imprensa e seus publicistas.6 6 Quadro esse que foi pouco a pouco diversificado no decorrer da fase “universitária” da nossa historiografia, tanto por meio de contribuições que atuaram no sentido de desfazer rotulações pelas quais a imprensa oficial e oficiosa era inferiorizada, quanto por meio de outras que atribuíram protagonismo a um elenco diverso de atores históricos ligados ao periodismo. Entre os nomes renovadores da produção acadêmica, pode-se mencionar Maria Beatriz Nizza da Silva (1978) no primeiro caso e, no segundo, Marco Morel (1986) e Isabel Lustosa (2000).

A exaltação do progresso da imprensa durante o Segundo Reinado

Se dermos crédito à contagem de Sousa Martins (1846SOUSA MARTINS, Francisco de. Progresso do jornalismo no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. VIII, p. 262-275, 1846. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsNnF5QnpQTURqOXc/view?resourcekey=0-ZdYNtxLTscuimNcKRdyKYA . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
), o número de jornais em circulação no país teria dobrado entre o final do Primeiro e o começo do Segundo Reinado. Até a data de sua correspondência à Revista IHGB, contou “perto de 80 publicações periódicas, muitas de grandiosas proporções, e outras científicas e literárias, das quais algumas redigidas com gosto e talento” (SOUSA MARTINS, 1846SOUSA MARTINS, Francisco de. Progresso do jornalismo no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. VIII, p. 262-275, 1846. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsNnF5QnpQTURqOXc/view?resourcekey=0-ZdYNtxLTscuimNcKRdyKYA . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 275). Resultado combinado de aprimoramento gráfico e ampliação do quadro de colaboradores e assinantes - como ocorrera com o Jornal do Commercio -, tal crescimento tornara, a seu juízo, a nascente imprensa brasileira comparável com o que de mais avançado se conhecia sobre a atividade na Europa.

Mesmo admitindo não dispor de dados concretos suficientes para cálculo de tiragem anual em âmbito nacional, não se impediu o escritor de estimar uma produção de “8,6 milhões de folhas”. Quantidade esta que não estaria em descompasso com o montante publicado na Grã-Bretanha, que, em 1842, possuiria “521 jornais” e uma produção de “61,4 milhões” de exemplares, mas que, em termos de país, devia ser “quase sete vezes maior que a população livre do Brasil” (SOUSA MARTINS, 1846SOUSA MARTINS, Francisco de. Progresso do jornalismo no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. VIII, p. 262-275, 1846. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsNnF5QnpQTURqOXc/view?resourcekey=0-ZdYNtxLTscuimNcKRdyKYA . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 273). Ou ainda, em toda a França que, em 1836, quando se publicava “558 a 560 jornais regular e periodicamente”, sua população “não era menos de 32 milhões, oito vezes maior do que a nossa povoação livre”; o que lhe permitiria concluir que “o número dos nossos jornais não se acha em desproporção” (SOUSA MARTINS, 1846SOUSA MARTINS, Francisco de. Progresso do jornalismo no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. VIII, p. 262-275, 1846. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsNnF5QnpQTURqOXc/view?resourcekey=0-ZdYNtxLTscuimNcKRdyKYA . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 274).

Sem que se pretenda submeter à prova a veracidade dessas informações, convém compreender o significado que se produz com base nelas. Pois, ao forçar comparação do caso brasileiro com o europeu, o membro do IHGB - e autor daquele que seria o primeiro artigo de investigação histórica especificamente sobre o assunto - constrói um discurso cuja intenção é exaltar o desenvolvimento do nosso jornalismo, a começar pela escolha do próprio título da peça: Progresso do jornalismo no Brasil. O conteúdo do texto que se elabora, ao longo de 14 páginas, explicita que a escrita da história é, na verdade, concebida como uma espécie de ato patriótico, em prol do engrandecimento da jovem nação e sua imprensa.

Isto quer dizer que não se trata tão só de levantamento e tratamento documental - procedimentos que, aliás, são básicos da investigação histórica e que, em seu trabalho, estão prejudicados por manifestações de outra natureza, nitidamente político-doutrinária. Em vista disso, o que se manifesta é o desejo por parte do erudito de que floresça no país o gosto pela leitura jornalística e que a imprensa se estabeleça como meio de instrução, para “que daqui a mais anos corramos o páreo com as nações mais civilizadas do antigo continente”:

qualquer porém que seja a nossa inferioridade a este respeito (que de boamente confessamos), não se pode contestar que os progressos do jornalismo no Brasil têm sido superiores a quanto era possível esperar do nosso estado de atraso na instrução pública, e que este ardor nacional pela leitura jornalística nos deve augurar mui rápidos progressos na instrução do povo, se a administração houver de empregar medidas mais eficazes, e um sistema melhor concebido para propagar a instrução popular pelas classes ínfimas da sociedade (SOUSA MARTINS, 1846SOUSA MARTINS, Francisco de. Progresso do jornalismo no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. VIII, p. 262-275, 1846. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsNnF5QnpQTURqOXc/view?resourcekey=0-ZdYNtxLTscuimNcKRdyKYA . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 274).

Artigo mais completo foi entregue por Moreira de Azevedo, médico e secretário do IHGB que se aperfeiçoara em biografar as personalidades do Segundo Reinado. Intitulado Origem e desenvolvimento da imprensa no Rio de Janeiro (1865), o relato de 55 páginas detalha como a situação obscurantista na colônia mudou com a transferência da corte para o Brasil e, a partir de 1821, com o fim do controle censório e do monopólio real sobre a impressão, quando houve abertura de novas oficinas tipográficas e multiplicação das publicações periódicas.

No Rio de Janeiro de 1860, haveria em circulação 34 periódicos, os quais variavam essencialmente entre duas tendências jornalísticas. A primeira a que se refere o historiador fluminense é o panfletarismo, com predomínio até o período regencial, quando proliferaram pasquins divididos em facções políticas e dotados de linguagem violenta. Passaram estes a dividir espaço com as folhas literárias que vieram a florescer durante o governo de d. Pedro II. Com tal renovação que não foi só estilística, mas também gráfica, nosso periodismo já seria digno de comparação com o estrangeiro:

fácil é reconhecer o desenvolvimento que tem tido entre nós a imprensa periódica, política e literária; os nossos diários não são inferiores aos da Europa nem em formato, nem em variedade de matéria, nem em nitidez de impressão. Já se foram os tempos em que o jornal político era o pelourinho das reputações, o cepo cruento onde se sacrificavam a honra, o nome, a dignidade, os brios de todos; [...] o jornalismo já não é o pasquim antigo, é o farol que guia, educa e doutrina o povo; não é a sátira grosseira e poluta de outrora, porém a crônica, a histórica, a crítica, o pensamento, a vida do progresso social (MOREIRA DE AZEVEDO, 1865MOREIRA DE AZEVEDO, Manuel Duarte. Origem e desenvolvimento da imprensa no Rio de Janeiro. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. XXVIII, p. 169-224, 1865. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsc015R3hMbWdVcjg/view?resourcekey=0-SQLoNNWyYwUoVxQmUZDc4Q . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 223-224).

A imprensa é, nessa visão, meio para dirigir a opinião pública e promover o progresso intelectual do povo, ainda em situação de precariedade material e moral e, por isso, impedido de se constituir como nação. Daí o elogio ao jornalismo literário por incutir o gosto pelas letras, unindo os indivíduos em torno de algo sublime. O jornalismo político, ao contrário, atuaria para dispersão social e cisão partidária, incitando conflitos entre os setores. Logo, qualquer sinal de superação da fase “descomedida” do nosso periodismo deveria ser apreciada como indicativo de adiantamento cultural. O que fica explícito, portanto, é um juízo de valor conservador a respeito dos pasquins em benefício das folhas literárias, entendidas como forma ideal para ilustrar a opinião pública nacional.

Inscreve-se, em suma, o fenômeno jornalístico em uma linha de desenvolvimento contínuo, iniciada com a abolição da censura prévia e a possibilidade de livre circulação dos impressos, quando já encaminhado o processo de independência. Todavia, ainda segundo o historiador do IHGB, não é nesse contexto de agitação política, nem na fase do governo provisório, que os jornais progridem em sua missão de instruir o povo. É apenas com a estabilidade alcançada durante o reinado de d. Pedro II que são criadas condições promissoras para o desenvolvimento do jornalismo brasileiro. A liberdade de imprensa conquistada no período é apontada como fator determinante para tanto.

Concordando com esta leitura fornecida por seu antecessor no instituto, Fleiuss sublinha que “a Revolução Francesa de 1830 sobremodo exaltou os ânimos de nossos publicistas”, de modo que, “em 1831, depois do golpe de Estado”, o nosso “jornalismo aberrou de sua instituição, esqueceu seus deveres” (FLEIUSS, 1922FLEIUSS, Max. História da imprensa no Brasil. In: INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO. Diccionario historico, geographico e ethnographico do Brasil: commemorativo do primeiro centenario da Independencia. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1922. p. 1550-1585. , p. 1557); o que só veio a se alterar com a passagem da regência, quando:

fulguram na imprensa do Rio as penas de José Clemente Pereira, Rodrigues Torres, depois visconde de Itaborahy; Evaristo da Veiga, e a de Bernardo de Vasconcellos em Minas; Justiniano José da Rocha e Sales Torres Homem, depois visconde de Inhomirim, congraçando os ânimos dos mais ardorosos, tenazmente se esforçaram por arrancar a pátria à guerra civil e à violação estrangeira, sedimentando a duradoura paz do Segundo Império (FLEIUSS, 1922FLEIUSS, Max. História da imprensa no Brasil. In: INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO. Diccionario historico, geographico e ethnographico do Brasil: commemorativo do primeiro centenario da Independencia. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1922. p. 1550-1585. , p. 1557).

O que se constata nesse meio-tempo, entre os textos de um e outro secretário do IHGB, são antes iniciativas de inventariação do jornalismo em âmbito regional do que nacional, empreendidas por homens de letras que, entre outros postos nas sociedades, eram membros efetivos ou correspondentes dos institutos provinciais/estaduais, a mencionar: João Francisco Dias Cabral (1874) em Alagoas; César Augusto Marques (1878) no Maranhão; João Batista Perdigão de Oliveira (1897PERDIGÃO DE OLIVEIRA, João Batista. A imprensa no Ceará. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, t. XI, p. 61-77, 129-141 e 187-203, 1897. Disponível em: Disponível em: https://www.institutodoceara.org.br/1897-2/ . Acesso em: 20 out. 2023.
https://www.institutodoceara.org.br/1897...
) no Ceará; Lafayette de Toledo (1898TOLEDO, Lafayette de. Imprensa paulista. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. III, p. 303-521, 1898. Disponível em: Disponível em: https://archive.org/details/revistadoinstitu03instuoft/page/302/ . Acesso em: 20 out. 2023.
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) em São Paulo; e Xavier da Veiga (1898VEIGA, José Pedro Xavier da. A imprensa em Minas-Geraes (1807-1897). Ouro Preto: Imprensa Official de Minas-Geraes, 1898. ) em Minas Gerais. O levante deste conjunto heroico permite afirmar que a pesquisa brasileira sobre imprensa periódica nasceu por meio do registro histórico comentado dos jornais provinciais, majoritariamente do nordeste e sudeste do país.7 7 Ao longo da primeira metade do século XX, a esses somaram-se relatos de outros historiadores e jornalistas, a ilustrar: Guilherme Studart (1904) e Eusebio Néri Alves de Souza (1933) no Ceará; Antonio Egydio Martins (1912) em São Paulo; Alcides Bezerra (1922) na Paraíba; e Nestor Ericksen (1941) no Rio Grande do Sul.

Entre breves inventários e longos catálogos cronológicos, a maioria se diferenciava mais pela massa de documentação sistematizada do que por proposta de interpretação da matéria em si. Digno de nota pela sua extensão é a contribuição de Lafayette de Toledo (1865-1907), que se encontra no terceiro volume da revista mantida pelo Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (IHGSP) e ultrapassa 200 páginas de informação. Ocupante de cargos na administração pública, além de redator em órgãos jornalísticos, dedicou-se a cobrir o período de 1827 a 1896, listando 1.536 títulos da imprensa paulista. E no volume 19º, sairia a maior de Affonso Antonio de Freitas (1868-1930) - liderança dentro do instituto -, abrangendo o período de 1823 a 1914 e superando 800 páginas de arrolamento.

Pelo menos até a primeira metade do século XX, não houve mudança significativa nessa forma de historicização da imprensa. Isso não exclui, todavia, como temos mostrado, que dessa produção se capture intenções comuns de interpretação do fenômeno. A tendência foi a de dar prioridade aos efeitos da modernização com a transição para o império, e depois para a república. Cada historiador teve a pretensão de retratar a imprensa do seu estado - de origem ou de destino - como uma das mais avançadas do país. Ou, como se trataria o caso de São Paulo, “indiscutivelmente a mais desenvolvida de todas as das outras circunscrições brasileiras”, visto que “apresenta todas as características do mais adiantado jornalismo e amplamente satisfeitas as necessidades e as exigências da sociedade moderna em que o progresso da civilização transformou o velho e lendário domínio dos bandeirantes” (FREITAS, 1915FREITAS, Affonso Antonio. A imprensa periodica de São Paulo desde os seus primordios em 1823 até 1914. São Paulo: Typ. do Diario Official, 1915. , p. 21).

Em síntese, de maneira semelhante como cada investigador oitocentista chamou para o seu lugar de fala “a prioridade da introdução da imprensa no Brasil” (CUNHA BARBOSA, 1902CUNHA BARBOSA, Antônio da. Origem e desenvolvimento da imprensa colonial brasileira. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. LXIII, pt. II, p. 239-262, 1902. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSseVJWSTFaQTY5Z2c/view?resourcekey=0-CgWsOpUD6NHFeUXiWxU1LA . Acesso em: 20 out. 2023.
https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7...
, p. 240) - vide o caso de Pernambuco discutido na seção anterior -, esta reivindicação se repetiu nos relatos que se referem ao processo de modernização dos periódicos. Porém, mais relevante do que as eventuais disputas que podem ter existido entre os membros das entidades estaduais é, pelo menos no presente estudo, apreender a tendência geral que se revela no modo de interpretar a trajetória do nosso periodismo.

A nosso juízo, a maioria deles compartilha da visão negativa introduzida por Moreira de Azevedo, segundo a qual os pasquins eram folhas ínferas, por serem palco de afrontas e desonras entre adversários políticos. Seria necessário ultrapassar essa fase “primitiva” da nossa imprensa, conferindo-lhe feição moderna em consonância com os tempos de estabilidade política e crescimento econômico. Deveria ela se constituir em meio de instrução pública para o povo. O declínio dos jornais panfletários, o cultivo de linguagem respeitosa e moderada, o apreço pela literatura e outras artes; enfim, tendências que foram interpretadas por eles enquanto alinhamento ao progresso, exigindo um jornalismo “neutro”, capaz de tratar com “imparcialidade” às questões que se colocam à sociedade brasileira.

Nesse horizonte, novamente, a produção especializada sobre imprensa está intimamente ligada ao projeto maior do IHGB de escrita da história do Brasil. Como observa Astor Antônio Diehl (1998DIEHL, Astor Antônio. A cultura historiográfica brasileira: do IHGB aos anos 1930. Passo Fundo: Ediupf, 1998. , p. 31), “para o progresso de consolidação da Monarquia constitucional e do Estado centralizado, vislumbrando por parte dos políticos comprometidos, era necessária uma ordem que se contrapusesse ao caos reinante nas Repúblicas vizinhas”. Portanto,

as ideias orientadoras da constituição desse projeto são as ideias de civilização e progresso, buscando-se, para tanto, constituir a história do Estado iluminado, esclarecido e civilizado, o que seria, em outras palavras, um prolongamento do modelo civilizador europeu (DIEHL, 1998DIEHL, Astor Antônio. A cultura historiográfica brasileira: do IHGB aos anos 1930. Passo Fundo: Ediupf, 1998. , p. 124).

A preocupação com essa “continuidade histórica, linear e em constante aperfeiçoamento” que “arrolava ao Brasil, como nação das nações em formação, um papel importante no futuro” (DIEHL, 1998DIEHL, Astor Antônio. A cultura historiográfica brasileira: do IHGB aos anos 1930. Passo Fundo: Ediupf, 1998. , p. 32), ao lado dos países mais industriosos da época, ainda perduraria na primeira metade do XX, como fica evidenciado na leitura apresentada por Barbosa Lima Sobrinho em seu ensaio. Tanto é que para esse ensaísta a principal preocupação era com o que o jornalismo se tornaria ao completar o ciclo modernizante, em conformidade com o modelo importado dos centros metropolitanos internacionais.

No que diz respeito à maneira de compreender o passado, é certo que, também para o autor de O problema da imprensa (1923), era de se comemorar a decadência do velho jornalismo de combate, visto que “a imprensa virulenta influi sobre o espírito público, perturba a difusão de uma cultura equilibrada, estorva a existência de políticos serenos” (BARBOSA LIMA SOBRINHO, 1923LIMA SOBRINHO, Barbosa. O problema da imprensa. Rio de Janeiro: Álvaro Pinto, 1923., p. 64). Nesse sentido, estava em grande parte de acordo com a visão “otimista” dos historiadores oitocentistas que enxergaram no Segundo Reinado estágio de superação da anarquia política, propiciando o florescimento do jornalismo moderado, enquanto escola para educar a nação.

Cada vez mais sintonizados com a opinião pública, os jornais deixariam de se apresentar como órgãos de um só partido, ainda que esta situação perdurasse fora dos centros. Observa que, na Primeira República, o Rio de Janeiro começa a contar com grandes diários que adquirem estrutura empresarial; em contrapartida, “a falta do jornalismo de partidos força o governo ao processo de subvenção” (BARBOSA LIMA SOBRINHO, 1923LIMA SOBRINHO, Barbosa. O problema da imprensa. Rio de Janeiro: Álvaro Pinto, 1923., p. 154). Transformada em negócio, a atividade deixaria de ser um sacerdócio e se tornaria como outras profissões remuneradas, exercida por pessoal especializado:

é a era dos tópicos superficiais, em que o comentário se move alegremente em torno do assunto, que não aparece, todavia, no seu verdadeiro aspecto, nem chega a ser discutido. Mais tarde é a ocasião do verdadeiro profissional, dos especialistas que vão tratar com proficiência das matérias do dia. Nessa época, o jornal é orientador, porque ensina e esclarece, exercendo uma atuação cuja eficiência dependerá do merecimento de seus especialistas (LIMA SOBRINHO, 1923LIMA SOBRINHO, Barbosa. O problema da imprensa. Rio de Janeiro: Álvaro Pinto, 1923., p. 50).

A emergência de interpretações como essa acaba por coincidir, de certa maneira, com o processo de declínio dos institutos históricos e seu modelo historiográfico, caracterizado “como sendo otimista nas suas formas de orientação sobre o passado e futuro” (DIEHL, 1998DIEHL, Astor Antônio. A cultura historiográfica brasileira: do IHGB aos anos 1930. Passo Fundo: Ediupf, 1998. , p. 121), ainda vigente no decorrer da primeira metade do século passado. Paralelo a isso, verifica-se a ascensão de tradição ensaística, com o aumento da publicação de textos de natureza crítico-reflexiva, oriundos em grande parte da intelectualidade que passa a se reunir em torno da Academia Brasileira de Letras. Além de Lima Sobrinho, pode-se mencionar outros como Elmano Cardim (1891-1979), Austregésilo de Athayde (1898-1993), Pedro Calmon (1902-1985) e Raimundo Magalhães Júnior (1907-1981), que contribuíram com ensaios sobre as fases paradigmáticas da imprensa brasileira desde a sua fundação (ver livro de conferências realizadas na ABL, 1958).

Essencial mesmo para uma ruptura com o que estava posto foi, todavia, a análise marxista de Nelson Werneck Sodré (1911-1999), presente em História da imprensa no Brasil (1966). Ao debruçar-se sobre o período imperial, acabou por reverter a leitura iniciada pelos historiadores do IHGB, ao argumentar que a imprensa prospera onde a atividade política é mais pujante, vendo justamente a fase “pasquinera” como o grande momento do nosso periodismo. Por isso mesmo, “o papel do pasquim na história da imprensa brasileira foi, assim, muito ao contrário do que tem sido indicado, de inequívoca e fundamental importância” (SODRÉ, 1999SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. 4. ed. atual. Rio de Janeiro: Mauad, 1999., p. 180).

Fora do eixo marxista, foi no meio universitário que surgiu outro contraponto ao entendimento visto no plano do IHGB, segundo o qual, uma vez superado o obscurantismo imposto pelos metropolitanos à colônia, a nossa imprensa se encontraria em condição de plena evolução. Para acadêmicos como Marques de Melo, o subdesenvolvimento do país não só implicou o atraso na chegada do prelo, mas no contínuo retardamento do seu jornalismo. Em suas palavras: “os obstáculos que se antepuseram ao surgimento prematuro da imprensa na antiga colônia portuguesa, são os mesmos que impedirão um crescimento das atividades editoriais e jornalísticas no Brasil independente” (MARQUES DE MELO, 1973MARQUES DE MELO, José. Sociologia da imprensa brasileira: a implantação. Petrópolis: Vozes, 1973., p. 19).

Essa argumentação foi, por último, trabalhada por Matías Molina em História dos jornais no Brasil (2015MOLINA, Matías Martínez. História dos jornais no Brasil: da era colonial à Regência (1500-1840). São Paulo: Companhia das Letras , 2015. ). Também para esse autor “as barreiras impostas por Lisboa para o desenvolvimento da economia e, principalmente, para a instrução e a formação da população local, teriam consequências no longo prazo” (MOLINA, 2015MOLINA, Matías Martínez. História dos jornais no Brasil: da era colonial à Regência (1500-1840). São Paulo: Companhia das Letras , 2015. , n.p.). Isto é, o analfabetismo e a baixa escolarização da população continuaram limitando a expansão dos jornais. Obstáculos estes que, conforme seu exame, não foram resolvidos com a subida ao trono de d. Pedro II nem com os governos da República Velha, embora não negue a influência exercida pela imprensa periódica nos rumos políticos do país.

Ademais, houve quem tenha rejeitado a hipótese de autonomização do jornalismo provincial em relação ao campo político no período pré-republicano, a exemplo de Ana Regina Rêgo, autora de Imprensa piauiense: atuação política no século XIX (2001RÊGO, Ana Regina Barros Leal. Imprensa piauiense: atuação política no século XIX. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2001. ). Entre órgãos conservadores e liberais que permaneceram funcionando como extensão das oligarquias e dos partidos, em vez da “preocupação com o progresso nacional ou com os destinos da província”, “ocupam-se em colocar nas páginas impressas as brigas e intrigas do cotidiano” (REGO, 2001RÊGO, Ana Regina Barros Leal. Imprensa piauiense: atuação política no século XIX. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2001. , p. 120). No fim das contas, “trocando o nome dos jornais, decerto, não seria possível distinguir a quem pertence este ou aquele discurso, a não ser pelas marcas político-partidárias e pelas denominações dos próprios periódicos” (REGO, 2001RÊGO, Ana Regina Barros Leal. Imprensa piauiense: atuação política no século XIX. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2001. , p. 301).

Com base em constatações como essas, observa-se como a produção historiográfica das últimas décadas termina por atuar no sentido de desconstrução de uma série de narrativas que se entrelaçaram ao projeto sustentado pelo IHGB, até meados do século XX. Na perspectiva emergente, questiona-se ou nega-se que, por exemplo, teria sido repentina e completa a substituição do jornalismo de combate por outro, fincado em valores tais como neutralidade e imparcialidade. Quer dizer que, de maneira diferente do que se costumava afirmar, levaria tempo para que a imprensa brasileira conseguisse êxito na criação de linguagem própria, mantendo-se profundamente atrelada às práticas políticas e literárias.

Considerações finais

Desde o ponto de vista da sociologia dos intelectuais, o perfil dos historiadores oitocentistas da imprensa em pouco ou nada se difere dos desbravadores inscritos nos ramos tradicionais da disciplina. Como sintetiza Ângela de Castro Gomes (1996GOMES, Angela Maria de Castro. História e historiadores. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1996.), trata-se de “um conjunto de homens em sua maioria bem-nascidos e bem-educados”, pertencentes geralmente “à alta aristocracia brasileira, muito mais no sentido político do que no sentido estrito da riqueza econômica”. Era-lhes comum a atividade de imprensa, sendo esta a porta de entrada para o mercado intelectual e, sem demora, para a construção de carreira política ou conquista de posição na burocracia estatal8 8 Como pontua Guimarães (2011, p. 85), uma “marca característica dessa elite intelectual e política era a carreira no serviço público, com o objetivo maior de obter reconhecimento como fiel servidor do Estado, que se expressava através da concessão de um título de nobreza”. . Independente de classe, raros oriundos da região sul, sendo a quase totalidade das regiões nordeste e sudeste, e tendo frequentado “estudos superiores regulares: os mais velhos na Europa, mas a maioria no Brasil, nas tradicionais escolas de direito, medicina e engenharia do Rio, Recife, São Paulo, Salvador e Ouro Preto” (GOMES, 1996GOMES, Angela Maria de Castro. História e historiadores. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1996., p. 44).

Apenas para referir dois exemplos entre os nomes que se dedicaram à história da imprensa, pode-se comentar as trajetórias de Max Fleiuss e Alfredo de Carvalho. Com origem na aristocracia pernambucana, este iniciou os estudos de engenharia na Alemanha, completando-os nos Estados Unidos. Antes de retornar para se estabelecer em Recife, residiu em Santos, onde foi redator da imprensa local. Já o primeiro, filho de Henrique Fleiuss (1824-1882), renomado litógrafo e pintor alemão radicado na capital do país, cursou direito na Faculdade do Rio de Janeiro. Além de trilhar carreira no IHGB, foi membro de outras instituições nacionais e estrangeiras, entre Alemanha, Argentina, Cuba, Espanha e Portugal. Na imprensa carioca, atuou como colaborador de publicações literárias e culturais.

O fato de o periodismo ser exercido por estes e tantos historiadores do período importa, na medida em que ajuda a compreender o modo como concebiam a imprensa enquanto fonte de pesquisa. Por serem eles mesmos atuantes em jornais e revistas, estranho seria se não atribuíssem valor de documento histórico a esses impressos, os quais assinavam como redatores, críticos literários etc. No posto de historiadores, em seus estudos o que prevalece é um entendimento geral da imprensa como repositório de verdades sobre o passado. Isto é, uma fonte fidedigna ao investigador, pois lhe forneceria acesso imediato aos fatos como realmente aconteceram. Ideia esta que se repete na produção historiográfica do século XIX e ainda permanece nas primeiras décadas do século XX.

A concepção compartilhada por essa intelectualidade era de que a imprensa se constitui em meio de instrução pública, um elemento para o progresso cultural do país. Em sua fase panfletária, ela se encontraria desviada de sua finalidade, pois fora convertida em palco de calúnia e difamação. Daí os elogios constantes ao período do Segundo Reinado, quando o pasquim deixaria de ser a forma dominante da imprensa e ocorreria em maior número o florescimento das folhas literárias, espalhando pela nação o gosto pelas letras e artes. Tal leitura histórica, por enaltecer o jornalismo durante a fase monárquica independente, em última análise, se relaciona a “uma militância intelectual homogênea, marcada pela fidelidade ao Imperador” (GUIMARÃES, 1995GUIMARÃES, Lucia Maria Paschoal. Debaixo da imediata proteção de Sua Majestade Imperial: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838-1889). Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, a. 156, n. 388, p. 459-613, jul./set. 1995. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsMU16eUE2T3huTDg/view?resourcekey=0-tjNnXEsMz2sEoNvCASBCTA . Acesso em: 20 out. 2023.
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, p. 599).

Embora seja “possível que o esgotamento do modelo dos IHGs tenha colaborado para a descontinuidade dessa historiografia tradicional: descritiva, relatorial, cronologista e preocupada com o levantamento de documentação sobre e dos jornais” (ROMANCINI, 2007ROMANCINI, Richard. História e Jornalismo: reflexões sobre campos de pesquisa. In: LAGO, Cláudia; BENETTI, Marcia (org.). Metodologia de Pesquisa em Jornalismo. Petrópolis: Vozes , 2007. p. 23-47., p. 31), isto não permitiu que fosse verificada uma ruptura epistemológica com a nascente historiografia universitária (ver, por exemplo, VIANNA, 1945VIANNA, Hélio. Contribuição à história da imprensa brasileira. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional , 1945.). No caso dos estudos dos jornais, isso se daria mais tarde, pode-se afirmar, com a análise de Nelson Werneck Sodré. Pois, em História da imprensa no Brasil (1966), desfaz-se a leitura em linha evolutiva iniciada pelos historiadores do IHGB, ao argumentar que a imprensa prospera onde a atividade política é mais forte e diversificada, identificando justamente o momento em que o pasquim foi a tendência dominante como o estágio mais rico do nosso periodismo.

A principal exceção da primeira metade do século seria, como mostrado, o ensaio de Barbosa Lima Sobrinho, que se distingue em relação aos demais relatos por aprofundar questões de ética e liberdade de imprensa, ao passo que fornece síntese histórica sobre o desenvolvimento do jornalismo, até sua transformação em empresa comercial. Em vez de amplo levantamento documental, o trabalho deste constrói-se pelo esforço de interpretação, assim como de proposição para fins de intervenção no debate vigente sobre a regulamentação da atividade. Em razão disso, sua contribuição, antes de simbolizar os primórdios da historiografia universitária, pode ser melhor entendida como manifestação do chamado ensaísmo político, que predominou na historiografia nacional durante a primeira metade do século passado (MENDES, 2012MENDES, Claudinei Magno Magre. O ensaísmo na historiografia brasileira. Acta Scientiarum, Maringá, v. 34, n. 1, p. 91-100, jan./jun. 2012. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.unesp.br/items/57cc708b-c13e-44f7-9f1f-422b616be5f5 . Acesso em: 20 out. 2023.
https://repositorio.unesp.br/items/57cc7...
).

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  • PERDIGÃO DE OLIVEIRA, João Batista. A imprensa no Ceará. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, t. XI, p. 61-77, 129-141 e 187-203, 1897. Disponível em: Disponível em: https://www.institutodoceara.org.br/1897-2/ Acesso em: 20 out. 2023.
    » https://www.institutodoceara.org.br/1897-2/
  • PEREIRA DA COSTA, Francisco Augusto. Estabelecimento e desenvolvimento da imprensa em Pernambuco. Revista do Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano, Recife, n. 39, p. 25-54, 1891.
  • RÊGO, Ana Regina Barros Leal. Imprensa piauiense: atuação política no século XIX. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 2001.
  • RIZZINI, Carlos. Hipólito da Costa e o Correio Braziliense. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1957.
  • RIZZINI, Carlos. O livro, o jornal e a tipografia no Brasil, 1500-1822: com um breve estudo geral sobre a informação. 2. ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 1988 [1946] .
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  • SANTOS, Evandro. Ensaio sobre a constituição de uma ética historiográfica no Brasil oitocentista: Francisco Adolfo de Varnhagen, o historiador no tempo. 2014. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014.
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  • SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. 4. ed. atual. Rio de Janeiro: Mauad, 1999.
  • SOUSA MARTINS, Francisco de. Progresso do jornalismo no Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, t. VIII, p. 262-275, 1846. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B_G9pg7CxKSsNnF5QnpQTURqOXc/view?resourcekey=0-ZdYNtxLTscuimNcKRdyKYA Acesso em: 20 out. 2023.
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  • STUDART, Guilherme. Catálogo dos jornais de grande e pequeno formato publicados em Ceará. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, t. XVIII, p. 196-291, 1904. Disponível em: Disponível em: https://www.institutodoceara.org.br/revista/Rev-apresentacao/RevPorAno/1904/1904-CatalogodosJornaesdegrandepequenoporte.pdf Acesso em: 20 out. 2023.
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  • SOUZA, Eusebio Néri Alves de. A imprensa do Ceará dos seus primeiros dias aos atuais. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, t. XLVII, p. 7-45, 1933. Disponível em: Disponível em: https://www.institutodoceara.org.br/revista/Rev-apresentacao/RevPorAno/1933/1933-AImprensadoCearaemseusprimeirosdias.pdf Acesso em: 20 out. 2023.
    » https://www.institutodoceara.org.br/revista/Rev-apresentacao/RevPorAno/1933/1933-AImprensadoCearaemseusprimeirosdias.pdf
  • TOLEDO, Lafayette de. Imprensa paulista. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. III, p. 303-521, 1898. Disponível em: Disponível em: https://archive.org/details/revistadoinstitu03instuoft/page/302/ Acesso em: 20 out. 2023.
    » https://archive.org/details/revistadoinstitu03instuoft/page/302/
  • VEIGA, José Pedro Xavier da. A imprensa em Minas-Geraes (1807-1897). Ouro Preto: Imprensa Official de Minas-Geraes, 1898.
  • VENANCIO, Giselle Martins. Ler ciência no Brasil do século XIX: a Revista Popular, 1859-1862. História, Ciências, Saúde: Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 20, p. 1153-1162, nov. 2013. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/hcsm/a/cvpwJLhxWvvTPjTPjCFJmYB/?lang=pt Acesso em: 20 out. 2023.
    » https://www.scielo.br/j/hcsm/a/cvpwJLhxWvvTPjTPjCFJmYB/?lang=pt
  • VIANNA, Hélio. Contribuição à história da imprensa brasileira. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional , 1945.
  • 1
    Embora durante os setecentos surjam academias letradas com vocação historiográfica (ver KANTOR, 2004KANTOR, Iris. Esquecidos e renascidos: historiografia acadêmica luso-americana, 1724-1759. São Paulo: HUCITEC, 2004. ), há que se considerar que o estabelecimento da imprensa em terras brasileiras é posterior a esse período, estando relacionado à vinda da família real portuguesa, em 1808.
  • 2
    Referenciado como o principal historiador brasileiro do século XIX, Varnhagen é descrito por estudiosos a exemplo de Temístocles Cezar como, “simultaneamente, um tipo-ideal e um outsider. Tipo-ideal porque parece representar, com perfeição, as premissas que envolvem o que Rodrigo Turin, com precisão, designou elementos constituintes do ethos do historiador oitocentista: a sinceridade, a cientificidade e a utilidade. Outsider porque a sinceridade nem sempre é transparente, a cientificidade nem sempre é metodologicamente verificável e a utilidade nem sempre é evidente. Varnhagen foi, portanto, ao mesmo tempo, um modelo comum e um trânsfuga dissimulado” (CEZAR, 2018CEZAR, Temístocles. Ser historiador no século XIX: o caso Varnhagen. Belo Horizonte: Autêntica, 2018. , p. 20).
  • 3
    Ao retornar a Portugal, Varnhagen teve passagem pela imprensa literária, da qual se pode mencionar títulos como O Panorama (1837-1868) e a Revista Universal Lisbonense (1841-1853). Para um exame acerca dessa matéria, consultar a tese de doutorado de Evandro dos Santos (2014SANTOS, Evandro. Ensaio sobre a constituição de uma ética historiográfica no Brasil oitocentista: Francisco Adolfo de Varnhagen, o historiador no tempo. 2014. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014.).
  • 4
    Mais especificamente, conforme Guimarães (2011GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. Historiografia e Nação no Brasil (1838-1857). Rio de Janeiro: EdUERJ, 2011. , p. 143), ao realizar uma avaliação da Revista IHGB, “obras e fontes a respeito da questão indígena, da história regional, bem como relatórios de pesquisas e de viagens, [...] ocupam cerca de 73% da totalidade das publicações na revista”.
  • 5
    Conforme Giselle Martins Venancio (2013VENANCIO, Giselle Martins. Ler ciência no Brasil do século XIX: a Revista Popular, 1859-1862. História, Ciências, Saúde: Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 20, p. 1153-1162, nov. 2013. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/hcsm/a/cvpwJLhxWvvTPjTPjCFJmYB/?lang=pt . Acesso em: 20 out. 2023.
    https://www.scielo.br/j/hcsm/a/cvpwJLhxW...
    , p. 1161), editada pela Livraria e Casa Editorial Garnier, a referida revista destacou-se “no Brasil de meados do século XIX como espaço dinâmico de debate e divulgação de conhecimentos”, colaborando para que a ciência fosse considerada um “aspecto significativo” por um “público ampliado - para além dos círculos estritamente intelectuais”.
  • 6
    Quadro esse que foi pouco a pouco diversificado no decorrer da fase “universitária” da nossa historiografia, tanto por meio de contribuições que atuaram no sentido de desfazer rotulações pelas quais a imprensa oficial e oficiosa era inferiorizada, quanto por meio de outras que atribuíram protagonismo a um elenco diverso de atores históricos ligados ao periodismo. Entre os nomes renovadores da produção acadêmica, pode-se mencionar Maria Beatriz Nizza da Silva (1978SILVA, Maria Beatriz Nizza da. A primeira Gazeta da Bahia: Idade d’Ouro do Brazil. São Paulo: Cultrix, 1978.) no primeiro caso e, no segundo, Marco Morel (1986MOREL, Marco. Cipriano Barata. São Paulo: Brasiliense, 1986. ) e Isabel Lustosa (2000LUSTOSA, Isabel. Insultos impressos: a guerra dos jornalistas na Independência (1821-1823). São Paulo: Companhia das Letras, 2000.).
  • 7
    Ao longo da primeira metade do século XX, a esses somaram-se relatos de outros historiadores e jornalistas, a ilustrar: Guilherme Studart (1904STUDART, Guilherme. Catálogo dos jornais de grande e pequeno formato publicados em Ceará. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, t. XVIII, p. 196-291, 1904. Disponível em: Disponível em: https://www.institutodoceara.org.br/revista/Rev-apresentacao/RevPorAno/1904/1904-CatalogodosJornaesdegrandepequenoporte.pdf . Acesso em: 20 out. 2023.
    https://www.institutodoceara.org.br/revi...
    ) e Eusebio Néri Alves de Souza (1933SOUZA, Eusebio Néri Alves de. A imprensa do Ceará dos seus primeiros dias aos atuais. Revista do Instituto do Ceará, Fortaleza, t. XLVII, p. 7-45, 1933. Disponível em: Disponível em: https://www.institutodoceara.org.br/revista/Rev-apresentacao/RevPorAno/1933/1933-AImprensadoCearaemseusprimeirosdias.pdf . Acesso em: 20 out. 2023.
    https://www.institutodoceara.org.br/revi...
    ) no Ceará; Antonio Egydio Martins (1912MARTINS, Antonio Egydio. Jornaes e jornalistas. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. XVII, p. 113-138, 1912. Disponível em: Disponível em: http://ihgsp.org.br/revista-ihgsp-vol-17/ . Acesso em: 20 out. 2023.
    http://ihgsp.org.br/revista-ihgsp-vol-17...
    ) em São Paulo; Alcides Bezerra (1922BEZERRA, Alcides. A imprensa na Parahyba. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, João Pessoa, a. XIV, v. 5, p. 51-64, 1922. ) na Paraíba; e Nestor Ericksen (1941ERICKSEN, Nestor. A origem da imprensa no Rio Grande do Sul. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n. 81, p. 15-26, 1941. ) no Rio Grande do Sul.
  • 8
    Como pontua Guimarães (2011GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. Historiografia e Nação no Brasil (1838-1857). Rio de Janeiro: EdUERJ, 2011. , p. 85), uma “marca característica dessa elite intelectual e política era a carreira no serviço público, com o objetivo maior de obter reconhecimento como fiel servidor do Estado, que se expressava através da concessão de um título de nobreza”.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

  • Financiamento:

    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
  • Aprovação no comitê de ética:

    Não se aplica.
  • Modalidade de avaliação

    Duplo-cega por pares.
  • Contexto de pesquisa

    O artigo deriva da tese “História da historiografia da imprensa e do jornalismo no Brasil: do século XIX ao XXI”, orientada por Francisco Rüdiger e coorientada por Antonio Hohlfeldt, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Comunicação, defendida no ano de 2023 - https://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/10983.
  • Disponibilidade de dados de pesquisa e outros materiais

    Não se aplica.

Editado por

Editores responsáveis

Flávia Varella - Editora-chefe Breno Mendes - Editor executivo

Disponibilidade de dados

Não se aplica.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    04 Fev 2022
  • Revisado
    19 Abr 2022
  • Revisado
    19 Set 2022
  • Aceito
    18 Out 2022
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