Acessibilidade / Reportar erro

Queimaduras autoprovocadas no Brasil: revisão sistemática e meta-análise

RESUMO

Introdução:

Queimaduras representam um componente fundamental do trauma no Brasil, sendo responsáveis por 2 milhões de incidentes e 2.500 mortes anualmente. Queimaduras autointencionais estão associadas a pior prognóstico, maior superfície corporal queimada, maiores taxas de infecção e morte. A falta de estudos sobre a problemática da autoimolação levanta questões epidemiológicas em relação às vítimas brasileiras. O estudo se objetivou investigar o perfil das queimaduras associados ao comportamento autolesivo entre vítimas brasileiras.

Métodos:

Esta revisão sistemática foi realizada de acordo com as diretrizes PRISMA 2020 e avaliou a correlação entre comportamento autolesivo como causa de queimaduras em vítimas brasileiras e suas implicações epidemiológicas nos últimos 20 anos (2003-2023). Os termos MeSH “Burns”, “Self-Injurious Behavior”, “Epidemiology” e “Brazil” foram elencados no PubMed/MEDLINE, SciELO e Cochrane Library e, após seleção por critérios de inclusão/exclusão, os estudos mais relevantes foram analisados criticamente.

Resultados:

Dos 1.077 estudos pré-selecionados, 92 foram potencialmente elegíveis, resultando em 7 manuscritos incorporados nesta revisão. Das 3.510 vítimas queimadas reunidas no conjunto de estudos selecionados, 311 casos apresentaram comportamento autolesivo. Pacientes que tentaram autoimolação apresentam maior risco de morte (p<0,05; RR=5,1 [3,2-8,1]) e maior superfície corporal queimada (p<0,05; MD=19,2 [10-28,2]), em comparação com casos acidentais. Ademais, o sexo feminino apresentou maior risco para tentativa de autoimolação (p<0,05; RR=4,01 [2,9-5,5]).

Conclusão:

Nossos resultados mostram que os casos de queimaduras autoprovocadas foram associados a uma maior área de superfície corporal queimada e a um maior risco de morte, e o sexo feminino foi identificado como um fator de risco relevante no Brasil.

Palavras-chave:
Queimaduras; Brasil; Revisão Sistemática; Metanálise

ABSTRACT

Introduction:

burns represent a pivotal component of trauma in Brazil, accounting for 2 million incidents and 2,500 deaths annually. Self-intentional burns are associated with a worse prognosis, larger burned surface area, higher infection rates, and death. The lack of studies on the issue of self-immolation raises epidemiological questions regarding Brazilian victims. This study aimed to investigate the profile of burn events associated with self-injurious behavior among Brazilian victims.

Methods:

this systematic review was performed according to PRISMA 2020 guidelines and evaluated the correlation between self-injurious behavior as a cause of burns in Brazilian victims and its epidemiological implications in the last 20 years (2003-2023). The MeSH terms “Burns”, “Self-Injurious Behavior”, “Epidemiology” and “Brazil” were queried in the PubMed/MEDLINE, SciELO, and Cochrane Library databases, and, after selection by inclusion/exclusion criteria, the most relevant studies were critically analyzed.

Results:

From 1,077 pre-selected studies, 92 were potentially eligible, resulting in 7 manuscripts incorporated in this review. From 3,510 burned victims assembled in the pool of selected studies, 311 cases displayed self-injurious behavior. Burned patients who attempted to burn their lives have a higher risk of death (p<0.05; RR=5.1 [3.2-8.1]) and larger burned surface area (p<0.05; MD=19.2 [10-28.2]), compared to accidental cases. Moreover, the female gender was at a higher risk of attempting self-immolation (p<0.05; RR=4.01 [2.9-5.5]).

Conclusion:

our results show that self-inflicted burn cases were associated with a larger burned surface area and a higher risk of death, and the female gender was identified as a relevant risk factor in Brazil.

Keywords:
Burns; Brazil; Self-Injurious Behavior; Systematic Review; Meta-Analysis

INTRODUÇÃO

As queimaduras são um componente epidemiológico fundamental do trauma11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....

2 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the World. Part II: Intentional burns in adults. Burns. 2012;38(5):630-7. doi: 10.1016/j.burns.2011.12.028.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2011.12....
-33 Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-...
. Relatórios mundiais demonstram uma média de 265.000 mortes anuais relacionadas com queimaduras e aproximadamente 11 milhões de vítimas de queimaduras que necessitam de cuidados especializados por ano, colocando estes eventos como a quarta principal causa de trauma direto em nível mundial33 Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-...
,44 Queiroz LFT, Anami EHT, Zampar EF, Tanita MT, Cardoso LTQ, Grion CMC. Epidemiology and outcome analysis of burn patients admitted to an Intensive Care Unit in a University Hospital. Burns. 2016;42(3):655-62. doi: 10.1016/j.burns.2015.08.002.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2015.08....
. Segundo dados oficiais do Ministério da Saúde do Brasil, as queimaduras representam aproximadamente dois milhões de ocorrências e 2.500 mortes anualmente no país55 Ministério da Saúde. Queimados - Portal da Saúde [Internet]. Ministério da Saúde do Brasil. 2017 [cited 2018 May 18]. Available from: http://portalms.saude.gov.br/component/content/article/842-queimados/40990-queimados
http://portalms.saude.gov.br/component/c...
,66 Adailton R, Junior S, Lorena R, Silva M, Lima GL, Cintra BB, et al. Perfil epidemiológico dos pacientes queimados no Hospital de Urgências de Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):251-5.. Os impactos das queimaduras vão além da mortalidade, pois podem resultar em sequelas físicas e psicológicas críticas e comprometer as interações sociais e o potencial laboral das vítimas em graus variados77 Rossi LA, Camargo C, Santos CMNM, Barruffin R de C de P, Carvalho EC de. A dor da queimadura: terrível para quem sente, estressante para quem cuida. Rev Lat Am Enfermagem. 2000;8(3):18-26. doi: 10.1590/s0104-11692000000300004.
https://doi.org/10.1590/s0104-1169200000...
,88 Gawryszewski VP, Ivata Bernal RT, da Silva NN, de Morais Neto OL, da Silva MMA, Medeiros Mascarenhas MD, et al. Atendimentos decorrentes de queimaduras em serviços públicos de emergência no Brasil, 2009. Cad Saude Publica. 2012;28(4):629-40. doi: 10.1590/S0102-311X2012000400003.
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201200...
.

Esses eventos podem ser categorizados separadamente em casos não intencionais/acidentais ou intencionais, dadas as particularidades das circunstâncias desencadeadoras de cada grupo, e a série de casos intencionais também pode ser subdividida em agressão ou queimaduras autoprovocadas99 Reiland A, Hovater M, McGwin G, Rue LW, Cross JM. The epidemiology of intentional burns. Journal of Burn Care and Research. 2006;27(3):276-80. doi: 10.1097/01.BCR.0000216301.48038.F3.
https://doi.org/10.1097/01.BCR.000021630...
,1010 Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07....
. As queimaduras autoprovocadas intencionalmente integram parte do comportamento autolesivo, abrangendo desde a autoflagelação até a tentativa de suicídio em si99 Reiland A, Hovater M, McGwin G, Rue LW, Cross JM. The epidemiology of intentional burns. Journal of Burn Care and Research. 2006;27(3):276-80. doi: 10.1097/01.BCR.0000216301.48038.F3.
https://doi.org/10.1097/01.BCR.000021630...
,1010 Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07....
. Embora menos frequente entre os traumas prevalentes no Brasil, o paciente suicida por autoimolação, significando o ato de autossacrifício pelo fogo, tem presença social relevante, carga emocional intensa e impacto particular na morbimortalidade e, em muitos casos, a equipe profissional de saúde não compreende plenamente as singularidades dessas experiências11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....
,1111 Mireski R, Talizin TB, Moya PS, Favoreto JPM, Peras PR, Gasparine AVC dos S, et al. Burns caused by attempted suicide and homicide and its association with prognosis. Rev bras queimaduras. 2016;15(2):87-91.. Estudos demonstraram que queimaduras devido a tentativas de autossacrifício estão associadas a mau prognóstico, maior área de superfície corporal queimada, infecções frequentes de feridas e sepse, além de maior taxa de mortalidade, especialmente quando o paciente apresenta diagnósticos psiquiátricos pré-existentes, como depressão ou transtornos psicóticos22 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the World. Part II: Intentional burns in adults. Burns. 2012;38(5):630-7. doi: 10.1016/j.burns.2011.12.028.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2011.12....
,99 Reiland A, Hovater M, McGwin G, Rue LW, Cross JM. The epidemiology of intentional burns. Journal of Burn Care and Research. 2006;27(3):276-80. doi: 10.1097/01.BCR.0000216301.48038.F3.
https://doi.org/10.1097/01.BCR.000021630...
,1212 Tarrier N, Gregg L, Edwards J, Dunn K. The influence of pre-existing psychiatric illness on recovery in burn injury patients: The impact of psychosis and depression. Burns. 2005;31(1):45-9. doi: 10.1016/j.burns.2004.06.010.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2004.06....
. Vários autores têm demonstrado um papel substancial dos aspectos socioculturais ligados a estes incidentes, amplamente correlacionados com o sexo, a vulnerabilidade socioeconômica e a religiosidade11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....
,22 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the World. Part II: Intentional burns in adults. Burns. 2012;38(5):630-7. doi: 10.1016/j.burns.2011.12.028.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2011.12....
,1313 Macedo JLS, Rosa SC, Gomes E Silva M. Queimaduras autoinfligidas: tentativa de suicídio. Rev Col Bras Cir. 2011;38(6):387-91. doi: 10.1590/S0100-69912011000600004.
https://doi.org/10.1590/S0100-6991201100...

14 Ahmadi A, Mohammadi R, Schwebel DC, Yeganeh N, Soroush A, Bazargan-Hejazi S. Familial risk factors for self-immolation: A case-control study. J Womens Health. 2009;18(7):1025-31. doi: 10.1089/jwh.2008.1192.
https://doi.org/10.1089/jwh.2008.1192...

15 Taghaddosinejad F, Sheikhazadi A, Behnoush B, Reshadati J, Anary SHS. A survey of suicide by burning in tehran, Iran. Acta Med Iran. 2010;48(4):266-72.
-1616 Cleary M, Singh J, West S, Rahkar Farshi M, Lopez V, Kornhaber R. Drivers and consequences of self-immolation in parts of Iran, Iraq and Uzbekistan: A systematic review of qualitative evidence. Burns. 2021 Feb 1;47(1):25-34. doi: 10.1016/J.BURNS.2019.08.007.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2019.08....
. Estas associações são proeminentes em países asiáticos, como a Índia, o Irã e o Iraque, onde a prevalência de queimaduras desta natureza é extremamente elevada11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....
,22 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the World. Part II: Intentional burns in adults. Burns. 2012;38(5):630-7. doi: 10.1016/j.burns.2011.12.028.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2011.12....
,99 Reiland A, Hovater M, McGwin G, Rue LW, Cross JM. The epidemiology of intentional burns. Journal of Burn Care and Research. 2006;27(3):276-80. doi: 10.1097/01.BCR.0000216301.48038.F3.
https://doi.org/10.1097/01.BCR.000021630...
,1515 Taghaddosinejad F, Sheikhazadi A, Behnoush B, Reshadati J, Anary SHS. A survey of suicide by burning in tehran, Iran. Acta Med Iran. 2010;48(4):266-72.

16 Cleary M, Singh J, West S, Rahkar Farshi M, Lopez V, Kornhaber R. Drivers and consequences of self-immolation in parts of Iran, Iraq and Uzbekistan: A systematic review of qualitative evidence. Burns. 2021 Feb 1;47(1):25-34. doi: 10.1016/J.BURNS.2019.08.007.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2019.08....

17 Ramim T, Mobayen M, Shoar N, Naderan M, Shoar S. Burnt wives in Tehran: A warm tragedy of self-injury. Int J Burns Trauma. 2013;3(1):66-71.
-1818 Natarajan M. Differences between intentional and non-intentional burns in India: Implications for prevention. Burns. 2014;40(5):1033-9. doi: 10.1016/j.burns.2013.12.002.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2013.12....
.

Portanto, dada a pertinência do tema e a escassez de estudos com vítimas brasileiras, realizamos uma revisão sistemática com meta-análise sobre o fenômeno das queimaduras autoprovocadas intencionais e os impactos epidemiológicos na morbimortalidade no Brasil.

MÉTODOS

Estratégia de pesquisa

O presente estudo é uma revisão sistemática sobre vítimas de queimaduras autoprovocadas intencionais no Brasil. Para orientar a investigação, os autores adotaram os passos para construção de uma revisão sistemática recomendados pela Cochrane1919 Higgins J, Thomas J, Chandler J, Cumpston M, Li T, Page M, et al. Cochrane Handbook for Systematic Reviews of Interventions. 2nd ed. Cochrane Handbook for Systematic Reviews of Interventions. Chichester : John Wiley & Sons; 2019. doi: 10.1002/9781119536604.
https://doi.org/10.1002/9781119536604...
. A realização da revisão também seguiu o protocolo Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) 20202020 Shamseer L, Moher D, Clarke M, Ghersi D, Liberati A, Petticrew M, et al. Preferred reporting items for systematic review and meta-analysis protocols (PRISMA-P) 2015: elaboration and explanation. BMJ. 2015;349:1-25. doi: 10.1136/bmj.g7647.
https://doi.org/10.1136/bmj.g7647....
,2121 Page MJ, McKenzie JE, Bossuyt PM, Boutron I, Hoffmann TC, Mulrow CD, et al. The PRISMA 2020 statement: an updated guideline for reporting systematic reviews. BMJ. 2021;372:1-9. doi: 10.1136/BMJ.N71.
https://doi.org/10.1136/BMJ.N71...
. Dois revisores independentes e qualificados consultaram as mais renomadas bases de dados científicas: PubMed/MEDLINE, SciELO e Cochrane Library. Os termos “Burns”, “Self-Injurious Behavior” do Medical Subjects Heading (MeSH) e seus termos de entrada “Self-Injury”, “Epidemiology” e “Brazil” foram revisados e escolhidos de acordo com o método PECO para revisões sistemáticas (Tabela 1), com os termos equivalentes dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) em português “Queimaduras”, “Comportamento Autodestrutivo” e “Autolesão”, “Epidemiologia” e “Brasil”. A busca foi restrita a estudos realizados na população brasileira e publicados em inglês ou português entre janeiro de 2003 e janeiro de 2023, abrangendo duas décadas da literatura mais recente. Para a estratégia de busca, as palavras-chave escolhidas foram consultadas individualmente e combinadas por meio dos operadores booleanos “AND” e “OR”. A Tabela 2 mostra a estratégia de busca específica para as bases de dados eletrônicas.

Tabela 1
Descritores de pesquisas segundo método PECO para revisões sistemáticas.

Tabela 2
Estratégia de busca em Bases de Dados Eletrônicas.

A ferramenta de risco de viés de Hoy2222 Hoy D, Brooks P, Woolf A, Blyth F, March L, Bain C, et al. Assessing risk of bias in prevalence studies: modification of an existing tool and evidence of interrater agreement. J Clin Epidemiol. 2012;65(9):934-9. doi: 10.1016/j.jclinepi.2011.11.014.
https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2011....
foi aplicada para avaliar a qualidade e o risco de viés entre os estudos e considerada adequada e fácil de usar nesta revisão. A ferramenta compreende 10 itens que avaliam a validade externa (itens 1 a 4) e interna (itens 5 a 10) de estudos de prevalência e abrange quatro domínios de viés: (1) viés relacionado à seleção, (2) viés associado à não resposta, (3) viés relacionado à medição e (4) viés associado à análise. Após concluir o julgamento, o revisor escolheu uma alternativa entre duas: (“sim”: 1 ponto) baixo risco ou (“não”: 0 pontos) alto risco. A opção de alto risco foi escolhida se o estudo não tivesse informações básicas para fazer o julgamento. O escore geral de qualidade foi classificado como baixo (8 a 10 itens marcados como de alto risco/”sim”), moderado (5 a 7 itens marcados como de alto risco/”sim”) e alto (0 a 4 itens marcados como alto risco/”sim”) risco de viés.

Critérios de eleição

Os seguintes critérios foram utilizados para considerar um estudo elegível para análise geral:

  1. Estudos originais com populações adultas sobre queimaduras autoprovocadas intencionais ou tentativas de suicídio por queimaduras em comparação com queimaduras autoprovocadas acidentais e os desfechos dos pacientes relacionados ao evento;

  2. Estudos realizados no Brasil e/ou com populações brasileiras;

  3. Tipo de artigo, incluindo artigo clássico, estudo comparativo, estudo de avaliação, estudo multicêntrico, estudo observacional e estudo ecológico.

As publicações foram excluídas se: os textos completos não estivessem acessíveis, não houvesse discriminação entre grupos de queimaduras intencionais e acidentais, estivessem duplicados e o estudo não apresentasse um desenho que correspondesse aos nossos objetivos.

Extração de dados

Dois revisores triaram os títulos e resumos dos artigos independentemente e, caso atendessem aos critérios de elegibilidade, o texto completo foi lido e incluído no conjunto da amostra. Qualquer discordância sobre a seleção do estudo entre os dois revisores foi resolvida por meio de consenso ou consulta com um terceiro ou quarto revisor. Os dados recuperados incluíram título do estudo, primeiro autor, ano, desenho do estudo, local do estudo, período do estudo, número total de casos, intenção do incidente (acidental ou intencional), número total de fatalidades, taxa de mortalidade hospitalar (TMH) e mortes por intenção, sexo, média de idade, etiologia/agentes das queimaduras, aceleradores de queimadura, superfície corporal queimada e lesão de vias aéreas.

Análise estatística

Os resultados gerais foram apresentados como média ponderada ± desvio padrão ponderado. Os dados adquiridos nos estudos foram analisados em termos de risco relativo/razão de risco (RR) para variáveis dicotômicas ou diferenças médias (DM) para variáveis contínuas, considerando intervalo de confiança superior a 95% (p<0,05). Todas as análises estatísticas e geração de gráficos foram realizadas no programa R-studio (R Foundation, v.4.0.3). A heterogeneidade foi avaliada pelo teste Q e estatística I², sendo que I² > 50% foi considerado um nível substancial de heterogeneidade, I² entre 25% e 50% foi considerado moderado, I² < 25% foi interpretado como nenhuma evidência de heterogeneidade relevante, todos correlacionados com p<0,05 para indicar diferenças significativas. Um modelo de efeitos aleatórios (método de Mantel-Haenszel) foi escolhido para realizar a meta-análise, inclusive na presença de heterogeneidade estatística ou se a situação foi identificada como portadora de potencial de heterogeneidade, o que é recomendado para ajustar a variabilidade observada em caso de alta heterogeneidade11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....
,1919 Higgins J, Thomas J, Chandler J, Cumpston M, Li T, Page M, et al. Cochrane Handbook for Systematic Reviews of Interventions. 2nd ed. Cochrane Handbook for Systematic Reviews of Interventions. Chichester : John Wiley & Sons; 2019. doi: 10.1002/9781119536604.
https://doi.org/10.1002/9781119536604...
,2323 Kontopantelis E, Springate DA, Reeves D. A Re-Analysis of the Cochrane Library Data: The Dangers of Unobserved Heterogeneity in Meta-Analyses. PLoS One. 2013;8(7):1-14. doi: 10.1371/JOURNAL.PONE.0069930.
https://doi.org/10.1371/JOURNAL.PONE.006...
. A meta-análise de subgrupos foi realizada com variáveis sobre as quais havia estudos suficientes disponíveis para formar subgrupos com dois estudos ou mais.

RESULTADOS

A busca inicial identificou 1.182 publicações a partir de todas as bases de dados, das quais foram excluídos 105 registros duplicados, recuperando 1.077 manuscritos. Excluímos 663 registros após a triagem dos títulos, e descartamos 322 publicações após a avaliação dos resumos, resultando em 92 artigos potencialmente relevantes. Após cuidadosa reavaliação dos resumos e leitura na íntegra das publicações que atenderam aos critérios de elegibilidade, sete44 Queiroz LFT, Anami EHT, Zampar EF, Tanita MT, Cardoso LTQ, Grion CMC. Epidemiology and outcome analysis of burn patients admitted to an Intensive Care Unit in a University Hospital. Burns. 2016;42(3):655-62. doi: 10.1016/j.burns.2015.08.002.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2015.08....
,1010 Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07....
,1111 Mireski R, Talizin TB, Moya PS, Favoreto JPM, Peras PR, Gasparine AVC dos S, et al. Burns caused by attempted suicide and homicide and its association with prognosis. Rev bras queimaduras. 2016;15(2):87-91.,1313 Macedo JLS, Rosa SC, Gomes E Silva M. Queimaduras autoinfligidas: tentativa de suicídio. Rev Col Bras Cir. 2011;38(6):387-91. doi: 10.1590/S0100-69912011000600004.
https://doi.org/10.1590/S0100-6991201100...
,2424 de Macedo JLS, Santos JB. Predictive factors of mortality in burn patients. Rev Inst Med Trop Sao Paulo. 2007;49(6):365-70. doi: 10.1590/s0036-46652007000600006.
https://doi.org/10.1590/s0036-4665200700...

25 Leão CEG, Andrade ES de, Fabrini DS, Oliveira RA de, Machado GLB, Gontijo LC. Epidemiologia das queimaduras no estado de Minas Gerais. Rev Bras Cir Plást. 2011;26(4):573-7. doi: 10.1590/S1983-51752011000400006.
https://doi.org/10.1590/S1983-5175201100...
-2626 De Campos EV, Park M, Gomez DS, Ferreira MC, Azevedo LCP. Characterization of critically ill adult burn patients admitted to a Brazilian intensive care unit. Burns. 2014;40(8):1770-9. doi: 10.1016/j.burns.2014.03.022.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.03....
manuscritos compuseram a amostra final, que passou por análises qualitativas e quantitativas (Figura 1). O risco global de viés dos sete estudos incluídos foi moderado (pontuação média=5,86 pontos; DP=0,69). Nenhum dos estudos apresentou baixo ou alto risco de viés. Os itens que mais variaram entre os estudos e que pareciam impor risco de viés foram dois critérios de validade interna (item 5 e 9) com foco no viés de medida e no viés de análise. Esses viéses estavam relacionados à duração do período de prevalência mais curto e à coleta de dados diretamente dos indivíduos (em oposição a de um terceiro). Além disso, todos os estudos apresentaram baixo risco de viés para a maioria dos critérios de validade interna (itens 1 a 3).

Figura 1
Fluxograma do método de busca e extração de dados.

Os artigos originais selecionados eram estudos longitudinais e uma pequena maioria era prospectiva (57,1%). Os estudos foram distribuídos geograficamente entre as regiões Sudeste (28,5%), Centro-Oeste (28,5%) e Sul (43%) do Brasil, entre 2003 e 2013. Os sete manuscritos selecionados estavam alinhados ao objetivo central deste estudo, que teve como foco, além de fornecer o número total de vítimas de queimaduras, diferenciar entre queimaduras acidentais e autoprovocadas (tentativas de suicídio). A Tabela 3 apresenta as principais informações obtidas dos artigos selecionados. As vítimas de queimadura por tentativa de homicídio (agressão) foram excluídas das análises.

Tabela 3
Estudos selecionados para a revisão sistemática.

Tabela 4
Ferramenta do risco de viés de Hoy.

Foram reunidas 3.510 vítimas de queimaduras no conjunto de estudos selecionados, composto por 2.370 (67,52%) homens e 1.140 (32,48%) mulheres, apresentando uma proporção geral de dois homens para cada mulher. A média de idade foi de 27,8 (±29,7) anos, a média da superfície corporal total queimada foi de 20,1% (±30,1%) e a taxa média de mortalidade hospitalar foi de 15,77%; 1.190 pacientes foram examinados para lesões de vias aéreas e 261 casos foram positivos para lesões, representando uma média de 25,4% (±21,4%) de vítimas entre os estudos. As chamas diretas/queimaduras de fogo foram a causa mais frequente dos incidentes, responsáveis por 2.077 (59,2%) vítimas, seguidas de escaldadura (938 vítimas; 26,7%), eletricidade (289 vítimas; 8,2%), agentes químicos (45 vítimas; 1,3%) e outros (48 vítimas; 1,4%). Não havia informação sobe o agente de queimadura utilizado para 113 (3,2%) vítimas; 530 vítimas tiveram o tipo de acelerador avaliado, sendo que o álcool líquido correspondeu ao maior número de casos (n=470; 88,7%), seguido pela gasolina (n=28; 5,3%) e energia elétrica de alta tensão (n=11; 2,1%), embora 21 (3,9%) casos não fornecessem explicitamente informações sobre o acelerador utilizado.

Conforme dito anteriormente, as tentativas de homicídio foram excluídas do universo de pacientes (n=57), resultando em um total de 3.457 casos, dos quais 311 (9%) foram por queimaduras intencionais autoprovocadas e 3.146 (91%) casos foram queimaduras acidentais. Não houve diferença quanto à idade entre vítimas de queimaduras acidentais e autoprovocadas (DM=6,84; IC95%=-5,05-18,72; p=0,25; Figura 2). A maioria dos pacientes com queimaduras autoprovocadas era do sexo feminino (64,9%, versus 35,1% do sexo masculino), com uma proporção média de mulheres:homens de 2:1.

Figura 2
Forest Plot da análise etária entre vítimas de queimaduras autoprovocadas (experimental) e acidentais (control).

Os pacientes do grupo tentativa de autoextermínio apresentaram área de superfície corporal total queimada significativamente maior (DM=19,18%; IC95%=10,03-28,33; p<0,05; Figura 3) e maior risco de morte (RR=5,13; IC95%=3,25-8,09; p<0,05; Figura 4). Não houve diferenças significativas no risco de lesão das vias aéreas entre pacientes queimados acidentalmente e casos de autoimolação (RR=2,42; IC95%=0,8-7,31; p=0,11; Figura 5). Quanto ao sexo, homens foram mais prevalentes nos incidentes de queimaduras acidentais (71,6%), mas o sexo feminino foi mais proeminente entre as vítimas de tentativa de autoimolação (64,9%). De fato, os homens apresentaram um risco mais elevado estatisticamente significativo de serem vítimas de queimaduras por acidente (RR=1,32; IC95%=1,10-1,57; p<0,05; Figura 6A), enquanto as tentativas de suicídio foram estatisticamente mais frequentes entre as mulheres (RR=4,01; I95%=2,94-5,46; p<0,05; Figura 6B). Esses achados estão alinhados com a observação de que uma mulher queimada hospitalizada apresentava uma chance significativamente maior de ter sido vítima de uma tentativa de suicídio do que de uma queimadura acidental (RR=2,46; IC95%=2,00-3,04; p<0,05; Figura 7).

Figura 3
Forest Plot da análise da área de superfície corporal queimada entre vítimas de queimaduras autoinfligidas (experimental) e acidentais (control).

Figura 4
Forest Plot da análise do risco de morte entre vítimas de queimaduras autoprovocadas (experimental) e acidentais (control).

Figura 5
Forest Plot da análise do risco de lesão de vias aéreas entre vítimas de queimaduras autoinfligidas (experimental) e acidentais (control).

Figura 6A
Casos de queimaduras acidentais entre homens (experimental) e mulheres (control).

Figura 6B
Casos de queimaduras autoprovocadas entre mulheres (experimental) e homens (control).

Figura 7
Comparação entre mulheres hospitalizadas, vítimas de queimaduras por tentativa de suicídio (experimental) e queimadura acidental (control).

DISCUSSÃO

Esta revisão sistemática e meta-análise teve como objetivo revisar e resumir as características epidemiológicas, prognóstico e riscos relacionados à associação de queimaduras e comportamento autolesivo no Brasil e conduzir uma avaliação estatística dos estudos publicados examinando vítimas brasileiras. O resultado da metanálise dos 7 estudos evidenciou que a prevalência geral agrupada do sexo masculino foi mais proeminente (67,2%), as vítimas eram adultos jovens (idade média de 27,8 anos) e os casos foram classificados como queimaduras graves de acordo com a área total média de superfície corporal queimada (20,1%). O resultado da análise de subgrupo com base na intenção do evento de queimadura (acidental vs. queimadura autoinfligida intencional) mostrou que a tentativa de autoimolação foi associada a uma maior área total de superfície corporal queimada (DM=19,18%; p<0,05), a um maior risco de morte (RR=5,12; p<0,05) e a uma maior chance de a vítima ser uma mulher (RR=4,01; p<0,05).

As queimaduras continuam a ser um problema grave e global de saúde pública22 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the World. Part II: Intentional burns in adults. Burns. 2012;38(5):630-7. doi: 10.1016/j.burns.2011.12.028.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2011.12....
,33 Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-...
,99 Reiland A, Hovater M, McGwin G, Rue LW, Cross JM. The epidemiology of intentional burns. Journal of Burn Care and Research. 2006;27(3):276-80. doi: 10.1097/01.BCR.0000216301.48038.F3.
https://doi.org/10.1097/01.BCR.000021630...
,2727 Citron I, Amundson J, Saluja S, Guilloux A, Jenny H, Scheffer M, et al. Assessing burn care in Brazil: An epidemiologic, cross-sectional, nationwide study. Surgery. 2018;163(5):1165-72. doi: 10.1016/j.surg.2017.11.023.
https://doi.org/10.1016/j.surg.2017.11.0...
. No Brasil, dados epidemiológicos de bancos de dados governamentais indicam incidência anual em unidades de milhões para representar essas vítimas, cujos principais fatores de risco estão no manuseio de álcool líquido e gasolina, fogos de artifício, fogueiras, vulnerabilidade socioeconômica e violência interpessoal66 Adailton R, Junior S, Lorena R, Silva M, Lima GL, Cintra BB, et al. Perfil epidemiológico dos pacientes queimados no Hospital de Urgências de Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):251-5.. A presente revisão mostrou que as chamas diretas ainda representam a principal causa de queimaduras entre as vítimas brasileiras, responsáveis por 2.077 (59,2%) casos no conjunto amostral. Também foi demonstrado que chamas diretas lideram a lista agentes causais de queimaduras em vários estudos prévios, independentemente do acelerador utilizado, não apenas para casos autoinfligidos, mas também para incidentes não intencionais33 Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-...
,66 Adailton R, Junior S, Lorena R, Silva M, Lima GL, Cintra BB, et al. Perfil epidemiológico dos pacientes queimados no Hospital de Urgências de Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):251-5.,2727 Citron I, Amundson J, Saluja S, Guilloux A, Jenny H, Scheffer M, et al. Assessing burn care in Brazil: An epidemiologic, cross-sectional, nationwide study. Surgery. 2018;163(5):1165-72. doi: 10.1016/j.surg.2017.11.023.
https://doi.org/10.1016/j.surg.2017.11.0...
.

O álcool líquido persiste como um dos aceleradores mais utilizados pelas vítimas, respondendo por 88,7% dos casos nesta revisão. Vários autores demonstraram resultados semelhantes em publicações prévias, destacando que o álcool líquido é um gatilho frequente e comum de queimaduras em muitos países33 Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-...
,66 Adailton R, Junior S, Lorena R, Silva M, Lima GL, Cintra BB, et al. Perfil epidemiológico dos pacientes queimados no Hospital de Urgências de Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):251-5.,88 Gawryszewski VP, Ivata Bernal RT, da Silva NN, de Morais Neto OL, da Silva MMA, Medeiros Mascarenhas MD, et al. Atendimentos decorrentes de queimaduras em serviços públicos de emergência no Brasil, 2009. Cad Saude Publica. 2012;28(4):629-40. doi: 10.1590/S0102-311X2012000400003.
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201200...
,2727 Citron I, Amundson J, Saluja S, Guilloux A, Jenny H, Scheffer M, et al. Assessing burn care in Brazil: An epidemiologic, cross-sectional, nationwide study. Surgery. 2018;163(5):1165-72. doi: 10.1016/j.surg.2017.11.023.
https://doi.org/10.1016/j.surg.2017.11.0...
,2828 Hugo V, Leite O, Prata L, Resende F, Souza EM, Xavier De-Assis I, et al. Acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe Análise dos acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):235-9.. Nesse sentido, é de conhecimento geral que o Brasil tem investido em políticas públicas para substituir o álcool líquido pelo álcool em gel para uso generalizado nas últimas décadas. Apesar das normas regulamentadoras para o uso domiciliar de álcool publicadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) em 2002, que trata da proibição da comercialização do álcool 54ºGL (Gay-Lussac), o álcool “comum” é ainda facilmente adquirido pela população brasileira em geral2828 Hugo V, Leite O, Prata L, Resende F, Souza EM, Xavier De-Assis I, et al. Acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe Análise dos acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):235-9.,2929 Arrunátegui GCC. Queimaduras com álcool em crianças: realidade brasileira e vulnerabilidades [Tese de Doutorado]. [São Paulo]: Universidade de São Paulo; 2011. doi: 10.11606/T.6.2011.tde-06062011-140523.
https://doi.org/10.11606/T.6.2011.tde-06...
. Além disso, foi apenas em 2013, por meio de uma Resolução do Governo, que a fabricação e distribuição de álcool líquido 54ºGL foram proibidas em território nacional2929 Arrunátegui GCC. Queimaduras com álcool em crianças: realidade brasileira e vulnerabilidades [Tese de Doutorado]. [São Paulo]: Universidade de São Paulo; 2011. doi: 10.11606/T.6.2011.tde-06062011-140523.
https://doi.org/10.11606/T.6.2011.tde-06...
.

Culturalmente, a maioria dos lares brasileiros ainda hoje dispõe de álcool líquido para uso antisséptico, limpeza doméstica, como combustível em churrascos, para evitar que diversos alimentos estraguem mais rápido para algumas famílias, como ingrediente em remédios caseiros e tratamentos informais, o que facilita acidentes, como relatado por Queiroz e cols.44 Queiroz LFT, Anami EHT, Zampar EF, Tanita MT, Cardoso LTQ, Grion CMC. Epidemiology and outcome analysis of burn patients admitted to an Intensive Care Unit in a University Hospital. Burns. 2016;42(3):655-62. doi: 10.1016/j.burns.2015.08.002.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2015.08....
,2828 Hugo V, Leite O, Prata L, Resende F, Souza EM, Xavier De-Assis I, et al. Acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe Análise dos acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):235-9.. O uso do álcool coloidal é incentivado por apresentar menor volatilidade e menor potencial de combustão que o álcool líquido tradicional, sem perder a eficiência bactericida, segundo Arrunátegui e cols., atributo que torna mais seguro o uso desse tipo de álcool2828 Hugo V, Leite O, Prata L, Resende F, Souza EM, Xavier De-Assis I, et al. Acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe Análise dos acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):235-9.,2929 Arrunátegui GCC. Queimaduras com álcool em crianças: realidade brasileira e vulnerabilidades [Tese de Doutorado]. [São Paulo]: Universidade de São Paulo; 2011. doi: 10.11606/T.6.2011.tde-06062011-140523.
https://doi.org/10.11606/T.6.2011.tde-06...
. Indubitavelmente, a pandemia da COVID-19 e a popularização do uso do álcool como agente sanitizante (mesmo em casa) contribuíram para o aumento da incidência de queimaduras relacionadas ao álcool nos últimos anos3030 Miles JC, Johnson A, Lloyd N. Alcohol-related burns during the COVID-19 pandemic. Vol. 47, Burns. Elsevier Ltd; 2021. p. 962-3. doi: 10.1016/j.burns.2020.12.013.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2020.12....
. A prática domiciliar de higienização das mãos com álcool 70% se difundiu notavelmente desde 2020 e, por sua vez, culminou no aumento da incidência de queimaduras acidentais domiciliares causadas por esse novo hábito de higiene, que se perpetuou desde o período de quarentena até os dias atuais, conforme brevemente relatado por Hohl, que mostrou que casos de queimaduras relacionadas ao álcool durante a pandemia da COVID-19 no Brasil resultaram em vítimas graves, com até 40% da área de superfície corporal queimada e quase 40% desses casos necessitaram de desbridamento cirúrgico e cobertura da pele por enxerto3030 Miles JC, Johnson A, Lloyd N. Alcohol-related burns during the COVID-19 pandemic. Vol. 47, Burns. Elsevier Ltd; 2021. p. 962-3. doi: 10.1016/j.burns.2020.12.013.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2020.12....
,3131 Hohl DH, Coltro PS, Silva GMA, Silveira VG, Farina Junior JA. Covid-19 quarantine has increased the incidence of ethyl alcohol burns. Burns. 2020;47(5):1212-1212. doi: 10.1016/j.burns.2020.05.025.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2020.05....
.

Na perspectiva da violência, as queimaduras intencionais autoprovocadas estimulam um olhar mais atento. O suicídio é um componente relevante no cotidiano dos serviços de trauma e emergência no Brasil, onde, apesar do crescimento significativo de 29,4% na incidência entre 1996 e 2016, ainda há escassez de produção científica e de políticas públicas nas diversas nuances desta questão específica3232 Marcolan JF, Silva DA da. O comportamento suicida na realidade brasileira: aspectos epidemiológicos e da política de prevenção. Revista M Estudos sobre a morte, os mortos e o morrer. 2019;4(7):31-44. doi: 10.9789/2525-3050.2019.v4i7.31-44.
https://doi.org/10.9789/2525-3050.2019.v...
, como nas queimaduras autoprovocadas. Decerto, as queimaduras por automutilação intencional não apresentam uma prevalência oficial elevada no Brasil. Contudo, esses eventos não são incomuns e estão sempre presentes nos serviços de emergência de todo o país; suas vítimas apresentam características particulares, tornando seu manejo desafiador e seu prognóstico obscuro1313 Macedo JLS, Rosa SC, Gomes E Silva M. Queimaduras autoinfligidas: tentativa de suicídio. Rev Col Bras Cir. 2011;38(6):387-91. doi: 10.1590/S0100-69912011000600004.
https://doi.org/10.1590/S0100-6991201100...
. Por outro lado, essa mencionada baixa prevalência pode refletir uma falha na notificação por parte dos profissionais e serviços de saúde pública, o que, em última análise, pode implicar que queimaduras autoprovocadas intencionais como parte do comportamento autolesivo são possivelmente subnotificadas no Brasil.

Esta revisão evidenciou que vítimas de queimaduras com intenção de automutilação apresentaram maior área total de superfície corporal queimada (DM=19,2% [10,03-28,33]) e maior chance de morte (RR=5,13 [3,25-8,09]). Duarte e cols. demonstraram que pacientes suicidas queimados apresentam maiores taxas de mortalidade, maior área de superfície corporal queimada, maiores taxas de complicações e pior prognóstico do que vítimas de incidentes acidentais1010 Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07....
. Macedo e cols. investigaram as particularidades das vítimas de queimaduras em tentativas de suicídio e também demonstraram que essas vítimas apresentam maior superfície corporal queimada e maiores taxas de mortalidade hospitalar1313 Macedo JLS, Rosa SC, Gomes E Silva M. Queimaduras autoinfligidas: tentativa de suicídio. Rev Col Bras Cir. 2011;38(6):387-91. doi: 10.1590/S0100-69912011000600004.
https://doi.org/10.1590/S0100-6991201100...
. Estudos prévios mostraram fatores que podem influenciar direta ou indiretamente no desfecho da vítima suicida queimada, identificando associações positivas com a presença de queimadura mais profundas, maiores taxas de infecção de feridas, maiores taxas de colonização por bactérias multirresistentes, tentativas anteriores de suicídio, maior número de diagnósticos psiquiátricos prévios e abuso pré-existente de álcool e/ou outras drogas1010 Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07....
,1313 Macedo JLS, Rosa SC, Gomes E Silva M. Queimaduras autoinfligidas: tentativa de suicídio. Rev Col Bras Cir. 2011;38(6):387-91. doi: 10.1590/S0100-69912011000600004.
https://doi.org/10.1590/S0100-6991201100...
,2424 de Macedo JLS, Santos JB. Predictive factors of mortality in burn patients. Rev Inst Med Trop Sao Paulo. 2007;49(6):365-70. doi: 10.1590/s0036-46652007000600006.
https://doi.org/10.1590/s0036-4665200700...
.

O sexo parece apresentar diferenças nas características epidemiológicas e clínicas das vítimas na presente revisão. Nossos resultados mostraram que o sexo masculino parece ser vítima de queimaduras com maior frequência, tanto no número total de eventos, dos quais os homens foram responsáveis por 67,5% das vítimas, como também no grupo de queimaduras acidentais, em que os homens representaram 71,6%. dos casos. Muitos fatores socioculturais no Brasil apoiam esse achado, a exemplo da maior exposição masculina a chamas, fogo e fogueiras, um hábito comum de ignorar os riscos de exposição (como o manuseio de fogos de artifício) e queimaduras acidentais relacionados às atividades de trabalho mais frequentes entre os homens brasileiros33 Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-...
,44 Queiroz LFT, Anami EHT, Zampar EF, Tanita MT, Cardoso LTQ, Grion CMC. Epidemiology and outcome analysis of burn patients admitted to an Intensive Care Unit in a University Hospital. Burns. 2016;42(3):655-62. doi: 10.1016/j.burns.2015.08.002.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2015.08....
. Por outro lado, o sexo feminino predominou nas vítimas de queimaduras por comportamento suicida, totalizando 64,9% dos casos. O panorama geral sugere que os homens brasileiros são mais vítimas de queimaduras em geral, enquanto as mulheres são responsáveis pela maioria das tentativas de suicídio por queimaduras, corroborado por nossa meta-análise. Além disso, ao avaliar o conjunto de mulheres queimadas hospitalizadas, os resultados evidenciaram que essa brasileira apresentava um risco aproximadamente 140% maior de ser internada por queimadura relacionada a tentativa de suicídio, do que por queimadura acidental.

O sexo feminino tem sido apontado como fator de risco para tentativa de autoimolação em todo o mundo11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....
,1414 Ahmadi A, Mohammadi R, Schwebel DC, Yeganeh N, Soroush A, Bazargan-Hejazi S. Familial risk factors for self-immolation: A case-control study. J Womens Health. 2009;18(7):1025-31. doi: 10.1089/jwh.2008.1192.
https://doi.org/10.1089/jwh.2008.1192...
,1717 Ramim T, Mobayen M, Shoar N, Naderan M, Shoar S. Burnt wives in Tehran: A warm tragedy of self-injury. Int J Burns Trauma. 2013;3(1):66-71.,3333 Maghsoudi H, Garadagi A, Jafary GA, Azarmir G, Aali N, Karimian B, et al. Women victims of self-inflicted burns in Tabriz, Iran. Burns. 2004;30(3):217-20. doi: 10.1016/j.burns.2003.10.010.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2003.10....
. Ahmadi e cols. demonstraram que as mulheres são as vítimas predominantes das tentativas de auto-sacrifício pelo fogo no Irã, onde o método de autoimolação representa 40% dos casos, dos quais as mulheres representam entre 70 e 88% de todas estas vítimas, e a taxa de mortalidade feminina chega até 80%1414 Ahmadi A, Mohammadi R, Schwebel DC, Yeganeh N, Soroush A, Bazargan-Hejazi S. Familial risk factors for self-immolation: A case-control study. J Womens Health. 2009;18(7):1025-31. doi: 10.1089/jwh.2008.1192.
https://doi.org/10.1089/jwh.2008.1192...
. Maghsoudi e cols. avaliaram 412 incidentes intencionais de queimaduras autoprovocadas no Irã entre 1998 e 2002, e 99% de todos os casos foram mulheres3333 Maghsoudi H, Garadagi A, Jafary GA, Azarmir G, Aali N, Karimian B, et al. Women victims of self-inflicted burns in Tabriz, Iran. Burns. 2004;30(3):217-20. doi: 10.1016/j.burns.2003.10.010.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2003.10....
. Mabrouk e cols. investigaram o sexo em um estudo com 759 vítimas egípcias de queimaduras, e 91,3% dos casos de comportamento suicida eram do sexo feminino3434 Mabrouk AR, Omar ANM, Massoud K, Sherif MM, el Sayed N. Suicide by burns: A tragic end. Burns. 1999;25(4):337-9. doi: 10.1016/S0305-4179(98)00179-X.
https://doi.org/10.1016/S0305-4179(98)00...
. No Curdistão, uma publicação sobre a proporção de mulheres para homens que tentam autoimolação mostrou uma razão de 10 para um11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....
. Até o momento da escrita deste manuscrito, nenhuma revisão sistemática ou meta-análise prévia avaliou as diferenças entre vítimas de queimaduras acidentais e aquelas relacionadas ao comportamento autolesivo no Brasil, e a presente investigação revelou uma proporção de duas mulheres para cada homem na tentativa de suicídio por queimaduras intencionais, enfatizando o gênero como questão de relevante preocupação na epidemiologia desse trauma em âmbito nacional.

A tentativa de suicídio por queimaduras é um tipo incomum de comportamento suicida nas nações ocidentais, como os Estados Unidos e os países da Europa Ocidental, onde totaliza aproximadamente 1% de todas as formas de suicídio22 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the World. Part II: Intentional burns in adults. Burns. 2012;38(5):630-7. doi: 10.1016/j.burns.2011.12.028.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2011.12....
,1414 Ahmadi A, Mohammadi R, Schwebel DC, Yeganeh N, Soroush A, Bazargan-Hejazi S. Familial risk factors for self-immolation: A case-control study. J Womens Health. 2009;18(7):1025-31. doi: 10.1089/jwh.2008.1192.
https://doi.org/10.1089/jwh.2008.1192...
. Os países em desenvolvimento, com um baixo nível de educação em toda a população, apresentam frequências mais elevadas de comportamentos autolesivos11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....
,3232 Marcolan JF, Silva DA da. O comportamento suicida na realidade brasileira: aspectos epidemiológicos e da política de prevenção. Revista M Estudos sobre a morte, os mortos e o morrer. 2019;4(7):31-44. doi: 10.9789/2525-3050.2019.v4i7.31-44.
https://doi.org/10.9789/2525-3050.2019.v...
,3535 Aghakhani N, Lopez V, Parizad N, Baghaei R. "It was like nobody cared about what I said?" Iranian women committed self-immolation: a qualitative study. BMC Womens Health. 2021;21(1):1-7. doi: 10.1186/S12905-021-01221-8/TABLES/1.
https://doi.org/10.1186/S12905-021-01221...
. Os países de baixa e média renda registram 80% de todos os suicídios globais, também apresentando uma maior prevalência de autoimolação, o que coloca o Brasil em maior risco11 Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08....
,1111 Mireski R, Talizin TB, Moya PS, Favoreto JPM, Peras PR, Gasparine AVC dos S, et al. Burns caused by attempted suicide and homicide and its association with prognosis. Rev bras queimaduras. 2016;15(2):87-91.,1414 Ahmadi A, Mohammadi R, Schwebel DC, Yeganeh N, Soroush A, Bazargan-Hejazi S. Familial risk factors for self-immolation: A case-control study. J Womens Health. 2009;18(7):1025-31. doi: 10.1089/jwh.2008.1192.
https://doi.org/10.1089/jwh.2008.1192...
,3232 Marcolan JF, Silva DA da. O comportamento suicida na realidade brasileira: aspectos epidemiológicos e da política de prevenção. Revista M Estudos sobre a morte, os mortos e o morrer. 2019;4(7):31-44. doi: 10.9789/2525-3050.2019.v4i7.31-44.
https://doi.org/10.9789/2525-3050.2019.v...
.

Campos e cols. examinaram as diferenças de sexo em um estudo observacional de cinco anos com 163 pacientes queimados do estado de São Paulo, e 54% das mortes femininas foram por suicídio, enquanto apenas 21% das mortes no grupo masculino foram relacionadas ao autoextermínio2626 De Campos EV, Park M, Gomez DS, Ferreira MC, Azevedo LCP. Characterization of critically ill adult burn patients admitted to a Brazilian intensive care unit. Burns. 2014;40(8):1770-9. doi: 10.1016/j.burns.2014.03.022.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.03....
. Ademais, Ramim e cols. exploraram o comportamento suicida e o estado civil num estudo com 35 pacientes vítimas de autoimolação no Irã e concluíram que as esposas que tentaram o suicídio se queimando eram jovens e viviam em um ambiente tradicional1717 Ramim T, Mobayen M, Shoar N, Naderan M, Shoar S. Burnt wives in Tehran: A warm tragedy of self-injury. Int J Burns Trauma. 2013;3(1):66-71.. O estado civil e possíveis problemas conjugais são variáveis pertinentes para o escopo desta revisão, uma vez que a violência doméstica muitas vezes leva as mulheres à automutilação por meio de queimaduras, conforme relatado por Diniz e cols. em estudo com 35 mulheres hospitalizadas por queimaduras em Salvador (Brasil), que mostrou que 83% das vítimas sofreram algum grau de violência doméstica e 100% das mulheres que tentaram o autoextermínio por queimaduras declararam que a violência infligida pelo marido ou companheiro precedeu sua tentativa de suicídio3636 Diniz NMF, Lopes RLM, Rodrigues AD, De Freitas DS. Women who were burned by their husbands or partners. Acta Paulista de Enfermagem. 2007;20(3):321-5. doi: 10.1590/S0103-21002007000300013.
https://doi.org/10.1590/S0103-2100200700...
. Contudo, a idade não apresentou diferença significativa entre os grupos da nossa amostra e a variável estado civil não estava disponível para análise, o que é uma das limitações desta revisão.

O estado psicológico das vítimas é outro atributo que precisa ser cuidadosamente explorado. Certamente, o autoextermínio por chamas diretas é uma das formas mais violentas e dramáticas de comportamento suicida, o que enfatiza a extrema perturbação emocional e o sofrimento psicológico das vítimas22 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the World. Part II: Intentional burns in adults. Burns. 2012;38(5):630-7. doi: 10.1016/j.burns.2011.12.028.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2011.12....
,1010 Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07....
,1717 Ramim T, Mobayen M, Shoar N, Naderan M, Shoar S. Burnt wives in Tehran: A warm tragedy of self-injury. Int J Burns Trauma. 2013;3(1):66-71.,3333 Maghsoudi H, Garadagi A, Jafary GA, Azarmir G, Aali N, Karimian B, et al. Women victims of self-inflicted burns in Tabriz, Iran. Burns. 2004;30(3):217-20. doi: 10.1016/j.burns.2003.10.010.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2003.10....

34 Mabrouk AR, Omar ANM, Massoud K, Sherif MM, el Sayed N. Suicide by burns: A tragic end. Burns. 1999;25(4):337-9. doi: 10.1016/S0305-4179(98)00179-X.
https://doi.org/10.1016/S0305-4179(98)00...
-3535 Aghakhani N, Lopez V, Parizad N, Baghaei R. "It was like nobody cared about what I said?" Iranian women committed self-immolation: a qualitative study. BMC Womens Health. 2021;21(1):1-7. doi: 10.1186/S12905-021-01221-8/TABLES/1.
https://doi.org/10.1186/S12905-021-01221...
. Paradoxalmente, o fator psicológico parece estar associado tanto a piores desfechos quanto, por outro lado, correlacionado com maiores probabilidades de sobrevivência, uma vez que muitas destas ocorrências podem carecer de premeditação ou real intenção de morte, o que, em muitos casos, resulta num risco de morte semelhante a queimaduras acidentais1010 Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07....
. Como publicado por Natarajan num estudo realizado na Índia, muitas das 168 (65%) mulheres vítimas de queimaduras autoprovocadas revelaram que não tinham real intenção de morrer, mas queriam de fato expressar a sua extrema angústia psicológica e emocional1818 Natarajan M. Differences between intentional and non-intentional burns in India: Implications for prevention. Burns. 2014;40(5):1033-9. doi: 10.1016/j.burns.2013.12.002.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2013.12....
. Duarte e cols., ao avaliarem 1.734 casos no estado do Rio Grande do Sul, mostraram que o sofrimento psíquico estava significativamente correlacionado com o comportamento suicida entre vítimas de queimaduras, em que o diagnóstico psiquiátrico prévio estava presente em aproximadamente 50% desses pacientes, muito superior aos 3,4% de diagnósticos psiquiátricos pré-existentes observados no grupo de queimaduras acidentais1010 Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07....
.

Esta revisão com meta-análise contém algumas limitações. Os autores tiveram como objetivo investigar as características epidemiológicas das queimaduras autoprovocadas em todo o país, mas a ausência de estudos de algumas partes do Brasil impede uma análise mais ampla. A escassez de dados referentes às regiões Norte e Nordeste é desafiadora, uma vez que a estratégia metodológica para aquisição de publicações não conseguiu agregar artigos dessas regiões para compor a unidade amostral final. Além disso, a possível existência de discrepâncias socioculturais entre estas regiões e o resto do país pode conter diferenças relevantes que, por sua vez, poderiam contribuir para a nossa análise com relação ao acesso aos serviços de saúde, ao risco de queimaduras, à existência ou não de centros de tratamento de queimados e a informações vitais sobre o perfil das vítimas queimadas33 Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-...
. Nessas regiões, é fundamental considerar queimaduras relacionadas a fogos de artifício e fogueiras devido às tradições culturais, religiosas e festivas33 Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-...
,66 Adailton R, Junior S, Lorena R, Silva M, Lima GL, Cintra BB, et al. Perfil epidemiológico dos pacientes queimados no Hospital de Urgências de Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):251-5.,2727 Citron I, Amundson J, Saluja S, Guilloux A, Jenny H, Scheffer M, et al. Assessing burn care in Brazil: An epidemiologic, cross-sectional, nationwide study. Surgery. 2018;163(5):1165-72. doi: 10.1016/j.surg.2017.11.023.
https://doi.org/10.1016/j.surg.2017.11.0...
, a exemplo das celebrações juninas e da tradicional festa de São João no Nordeste e as festas folclóricas no Norte. Além disso, o nível de escolaridade, o estado civil (como já mencionado nesta discussão), a ocupação laboral, a renda, os diagnósticos psiquiátricos pré-existentes, o uso de drogas, as tentativas anteriores, a rede de apoio familiar, o acesso a serviços de saúde privados ou públicos e outras vulnerabilidades socioeconômicas não estavam disponíveis para avaliação, e todas essas variáveis podem incorporar fatores de confusão que poderiam ter enviesado as análises. Outro ponto de preocupação avaliado durante a análise de risco de viés foi relacionado à duração do período estudado e ao método de aquisição de dados, que tinham maior probabilidade de estar associados ao viés quando um período de tempo curto foi estudado (por exemplo, um a dois anos) ou se os dados foram coletados retrospectivamente dos prontuários médicos do paciente. Essas limitações constituem bases para investigações analíticas mais amplas e estudos primários realizados por grupos de pesquisa, hospitais universitários, centros de emergência e trauma e departamentos governamentais de saúde em nível regional e nacional, a fim de se gerar dados mais robustos sobre queimaduras, especialmente aquelas relacionadas ao comportamento suicida.

CONCLUSÃO

Em conclusão, a presente revisão sistemática com meta-análise leva à inferência de que queimaduras autoprovocadas intencionalmente no âmbito do comportamento suicida representam um grave problema de saúde pública e estão no cerne da epidemiologia do trauma no Brasil. Essas vítimas brasileiras estão associadas a uma maior área de superfície corporal queimada e a um maior risco de morte do que os casos acidentais. Além disso, o sexo feminino foi identificado como um fator de risco considerável para essas circunstâncias, colocando as mulheres brasileiras como um alvo intervencionista central para políticas públicas e campanhas preventivas.

REFERENCES

  • 1
    Parvareh M, Hajizadeh M, Rezaei S, Nouri B, Moradi G, Esmail Nasab N. Epidemiology and socio-demographic risk factors of self-immolation: A systematic review and meta-analysis. Burns. 2018;44(4):767-75. doi: 10.1016/J.BURNS.2017.08.013.
    » https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2017.08.013
  • 2
    Peck MD. Epidemiology of burns throughout the World. Part II: Intentional burns in adults. Burns. 2012;38(5):630-7. doi: 10.1016/j.burns.2011.12.028.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2011.12.028
  • 3
    Santos JV, Souza J, Amarante J, Freitas A. Burden of Burns in Brazil from 2000 to 2014: A Nationwide Hospital-Based Study. World J Surg. 2017;41(8):2006-12. doi: 10.1007/s00268-017-3988-5.
    » https://doi.org/10.1007/s00268-017-3988-5
  • 4
    Queiroz LFT, Anami EHT, Zampar EF, Tanita MT, Cardoso LTQ, Grion CMC. Epidemiology and outcome analysis of burn patients admitted to an Intensive Care Unit in a University Hospital. Burns. 2016;42(3):655-62. doi: 10.1016/j.burns.2015.08.002.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2015.08.002
  • 5
    Ministério da Saúde. Queimados - Portal da Saúde [Internet]. Ministério da Saúde do Brasil. 2017 [cited 2018 May 18]. Available from: http://portalms.saude.gov.br/component/content/article/842-queimados/40990-queimados
    » http://portalms.saude.gov.br/component/content/article/842-queimados/40990-queimados
  • 6
    Adailton R, Junior S, Lorena R, Silva M, Lima GL, Cintra BB, et al. Perfil epidemiológico dos pacientes queimados no Hospital de Urgências de Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):251-5.
  • 7
    Rossi LA, Camargo C, Santos CMNM, Barruffin R de C de P, Carvalho EC de. A dor da queimadura: terrível para quem sente, estressante para quem cuida. Rev Lat Am Enfermagem. 2000;8(3):18-26. doi: 10.1590/s0104-11692000000300004.
    » https://doi.org/10.1590/s0104-11692000000300004
  • 8
    Gawryszewski VP, Ivata Bernal RT, da Silva NN, de Morais Neto OL, da Silva MMA, Medeiros Mascarenhas MD, et al. Atendimentos decorrentes de queimaduras em serviços públicos de emergência no Brasil, 2009. Cad Saude Publica. 2012;28(4):629-40. doi: 10.1590/S0102-311X2012000400003.
    » https://doi.org/10.1590/S0102-311X2012000400003
  • 9
    Reiland A, Hovater M, McGwin G, Rue LW, Cross JM. The epidemiology of intentional burns. Journal of Burn Care and Research. 2006;27(3):276-80. doi: 10.1097/01.BCR.0000216301.48038.F3.
    » https://doi.org/10.1097/01.BCR.0000216301.48038.F3
  • 10
    Duarte DW, Neumann CR, Weber ES. Intentional injuries and patient survival of burns: A 10-year retrospective cohort in southern Brazil. Burns. 2015;41(2):271-8. doi: 10.1016/j.burns.2014.07.019.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.07.019
  • 11
    Mireski R, Talizin TB, Moya PS, Favoreto JPM, Peras PR, Gasparine AVC dos S, et al. Burns caused by attempted suicide and homicide and its association with prognosis. Rev bras queimaduras. 2016;15(2):87-91.
  • 12
    Tarrier N, Gregg L, Edwards J, Dunn K. The influence of pre-existing psychiatric illness on recovery in burn injury patients: The impact of psychosis and depression. Burns. 2005;31(1):45-9. doi: 10.1016/j.burns.2004.06.010.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2004.06.010
  • 13
    Macedo JLS, Rosa SC, Gomes E Silva M. Queimaduras autoinfligidas: tentativa de suicídio. Rev Col Bras Cir. 2011;38(6):387-91. doi: 10.1590/S0100-69912011000600004.
    » https://doi.org/10.1590/S0100-69912011000600004
  • 14
    Ahmadi A, Mohammadi R, Schwebel DC, Yeganeh N, Soroush A, Bazargan-Hejazi S. Familial risk factors for self-immolation: A case-control study. J Womens Health. 2009;18(7):1025-31. doi: 10.1089/jwh.2008.1192.
    » https://doi.org/10.1089/jwh.2008.1192
  • 15
    Taghaddosinejad F, Sheikhazadi A, Behnoush B, Reshadati J, Anary SHS. A survey of suicide by burning in tehran, Iran. Acta Med Iran. 2010;48(4):266-72.
  • 16
    Cleary M, Singh J, West S, Rahkar Farshi M, Lopez V, Kornhaber R. Drivers and consequences of self-immolation in parts of Iran, Iraq and Uzbekistan: A systematic review of qualitative evidence. Burns. 2021 Feb 1;47(1):25-34. doi: 10.1016/J.BURNS.2019.08.007.
    » https://doi.org/10.1016/J.BURNS.2019.08.007
  • 17
    Ramim T, Mobayen M, Shoar N, Naderan M, Shoar S. Burnt wives in Tehran: A warm tragedy of self-injury. Int J Burns Trauma. 2013;3(1):66-71.
  • 18
    Natarajan M. Differences between intentional and non-intentional burns in India: Implications for prevention. Burns. 2014;40(5):1033-9. doi: 10.1016/j.burns.2013.12.002.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2013.12.002
  • 19
    Higgins J, Thomas J, Chandler J, Cumpston M, Li T, Page M, et al. Cochrane Handbook for Systematic Reviews of Interventions. 2nd ed. Cochrane Handbook for Systematic Reviews of Interventions. Chichester : John Wiley & Sons; 2019. doi: 10.1002/9781119536604.
    » https://doi.org/10.1002/9781119536604
  • 20
    Shamseer L, Moher D, Clarke M, Ghersi D, Liberati A, Petticrew M, et al. Preferred reporting items for systematic review and meta-analysis protocols (PRISMA-P) 2015: elaboration and explanation. BMJ. 2015;349:1-25. doi: 10.1136/bmj.g7647.
    » https://doi.org/10.1136/bmj.g7647.
  • 21
    Page MJ, McKenzie JE, Bossuyt PM, Boutron I, Hoffmann TC, Mulrow CD, et al. The PRISMA 2020 statement: an updated guideline for reporting systematic reviews. BMJ. 2021;372:1-9. doi: 10.1136/BMJ.N71.
    » https://doi.org/10.1136/BMJ.N71
  • 22
    Hoy D, Brooks P, Woolf A, Blyth F, March L, Bain C, et al. Assessing risk of bias in prevalence studies: modification of an existing tool and evidence of interrater agreement. J Clin Epidemiol. 2012;65(9):934-9. doi: 10.1016/j.jclinepi.2011.11.014.
    » https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2011.11.014
  • 23
    Kontopantelis E, Springate DA, Reeves D. A Re-Analysis of the Cochrane Library Data: The Dangers of Unobserved Heterogeneity in Meta-Analyses. PLoS One. 2013;8(7):1-14. doi: 10.1371/JOURNAL.PONE.0069930.
    » https://doi.org/10.1371/JOURNAL.PONE.0069930
  • 24
    de Macedo JLS, Santos JB. Predictive factors of mortality in burn patients. Rev Inst Med Trop Sao Paulo. 2007;49(6):365-70. doi: 10.1590/s0036-46652007000600006.
    » https://doi.org/10.1590/s0036-46652007000600006
  • 25
    Leão CEG, Andrade ES de, Fabrini DS, Oliveira RA de, Machado GLB, Gontijo LC. Epidemiologia das queimaduras no estado de Minas Gerais. Rev Bras Cir Plást. 2011;26(4):573-7. doi: 10.1590/S1983-51752011000400006.
    » https://doi.org/10.1590/S1983-51752011000400006
  • 26
    De Campos EV, Park M, Gomez DS, Ferreira MC, Azevedo LCP. Characterization of critically ill adult burn patients admitted to a Brazilian intensive care unit. Burns. 2014;40(8):1770-9. doi: 10.1016/j.burns.2014.03.022.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2014.03.022
  • 27
    Citron I, Amundson J, Saluja S, Guilloux A, Jenny H, Scheffer M, et al. Assessing burn care in Brazil: An epidemiologic, cross-sectional, nationwide study. Surgery. 2018;163(5):1165-72. doi: 10.1016/j.surg.2017.11.023.
    » https://doi.org/10.1016/j.surg.2017.11.023
  • 28
    Hugo V, Leite O, Prata L, Resende F, Souza EM, Xavier De-Assis I, et al. Acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe Análise dos acidentes por queimadura com álcool líquido em Unidade de Tratamento de Queimados em Sergipe. Rev Bras Queimaduras. 2016;15(4):235-9.
  • 29
    Arrunátegui GCC. Queimaduras com álcool em crianças: realidade brasileira e vulnerabilidades [Tese de Doutorado]. [São Paulo]: Universidade de São Paulo; 2011. doi: 10.11606/T.6.2011.tde-06062011-140523.
    » https://doi.org/10.11606/T.6.2011.tde-06062011-140523.
  • 30
    Miles JC, Johnson A, Lloyd N. Alcohol-related burns during the COVID-19 pandemic. Vol. 47, Burns. Elsevier Ltd; 2021. p. 962-3. doi: 10.1016/j.burns.2020.12.013.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2020.12.013.
  • 31
    Hohl DH, Coltro PS, Silva GMA, Silveira VG, Farina Junior JA. Covid-19 quarantine has increased the incidence of ethyl alcohol burns. Burns. 2020;47(5):1212-1212. doi: 10.1016/j.burns.2020.05.025.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2020.05.025
  • 32
    Marcolan JF, Silva DA da. O comportamento suicida na realidade brasileira: aspectos epidemiológicos e da política de prevenção. Revista M Estudos sobre a morte, os mortos e o morrer. 2019;4(7):31-44. doi: 10.9789/2525-3050.2019.v4i7.31-44.
    » https://doi.org/10.9789/2525-3050.2019.v4i7.31-44
  • 33
    Maghsoudi H, Garadagi A, Jafary GA, Azarmir G, Aali N, Karimian B, et al. Women victims of self-inflicted burns in Tabriz, Iran. Burns. 2004;30(3):217-20. doi: 10.1016/j.burns.2003.10.010.
    » https://doi.org/10.1016/j.burns.2003.10.010
  • 34
    Mabrouk AR, Omar ANM, Massoud K, Sherif MM, el Sayed N. Suicide by burns: A tragic end. Burns. 1999;25(4):337-9. doi: 10.1016/S0305-4179(98)00179-X.
    » https://doi.org/10.1016/S0305-4179(98)00179-X
  • 35
    Aghakhani N, Lopez V, Parizad N, Baghaei R. "It was like nobody cared about what I said?" Iranian women committed self-immolation: a qualitative study. BMC Womens Health. 2021;21(1):1-7. doi: 10.1186/S12905-021-01221-8/TABLES/1.
    » https://doi.org/10.1186/S12905-021-01221-8/TABLES/1
  • 36
    Diniz NMF, Lopes RLM, Rodrigues AD, De Freitas DS. Women who were burned by their husbands or partners. Acta Paulista de Enfermagem. 2007;20(3):321-5. doi: 10.1590/S0103-21002007000300013.
    » https://doi.org/10.1590/S0103-21002007000300013
  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    05 Out 2023
  • Aceito
    13 Fev 2024
Colégio Brasileiro de Cirurgiões Rua Visconde de Silva, 52 - 3º andar, 22271- 090 Rio de Janeiro - RJ, Tel.: +55 21 2138-0659, Fax: (55 21) 2286-2595 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revista@cbc.org.br